sábado, 4 de julho de 2009

Cultura pra todo gosto (crônica)

Marcelino dizia ser cabra macho. Macho, desses dos c... r... Insistia tanto em defender sua masculinidade, que jamais permitiu ao urologista examinar-lhe a próstata. “Não, cara, sou paraibano; ninguém toca nessa b… que somente a terra há de comer” – repetia para o doutor, todas as vezes que o procurava para tratar da saúde.

Cito essa faceta da personalidade do Marcelino sem qualquer propósito, a não ser o de relembrar a empáfia do personagem ao descrever suas másculas façanhas. Aliás, acho que ele não era arrogante, insolente ou presunçoso. Apenas um gozador.

Marcelino era bastante versátil. Exortava nomes de poetas, escritores, jornalistas, médicos, advogados e de pessoas famosas, dignas de reconhecimento. Importantes personalidades do mundo cultural e artístico mereciam sua admiração e respeito. Políticos competentes, honestos (um número bastante reduzido) e ousados eram alvo de seus elogios em conversas de fins de tarde com os amigos. Também execrava os corruptos, ladrões do erário, usurpadores da coisa pública.

Nesses encontros, divulgava notícias, falava de política, criticava procedimentos econômicos do governo, recitava poemas, cantava músicas populares. Enfim, preenchia as lacunas culturais dos companheiros menos intelectualizados. Preferia poesias de Carlos Drumonnd de Andrade e de Augusto dos Anjos, esse último seu ilustre conterrâneo. Tom Jobim, Chico Buarque e Zezé de Camargo distinguiam-se como compositores favoritos, demonstrando sua versatilidade. Roberto Pompeu de Toledo e Diogo Mainardi, escritores de “pena” imbatível e de elevado saber, diferenciavam-se dos demais jornalistas. Lia-os com veneração.

Crenças, costumes, padrões sociais, nada era desconhecido a Marcelino. Ele não se intimidava diante da ousadia. Certa vez, para escândalo de alguns amigos, recitou trechos de poesia do poeta negro, José Limeira, paraibano como ele.

Limeira era analfabeto.

As rimas do poeta paraibano não obedeciam a nenhum critério, a não ser o de expressar o som entre as palavras na construção de seus versos, às vezes ininteligíveis.

O negro era bom repentista.

Tornara-se conhecido como “O Poeta do Absurdo”.

Fazia jus ao título.

As poesias de José Limeira foram imortalizadas em livro de Orlando Tejo, outro poeta da Paraíba.

Disse Marcelino aos amigos, naquela tarde: "… A pedido de ouvintes, em roda de bate-papo e muita cachaça, Limeira glosou o seguinte mote: E o mundo não tese (de tesão) mais"

E recitou esses versos antológicos, da verve do saudoso poeta:

O velho Tomé de Souza,
Governador da Bahia,
Casou-se no mesmo dia
Com sua esposa;
F… que só raposa,
Pela frente e por detrás,
E depois foram pro cais,
Onde o navio trafega,
Comeram o c… de Nóbrega,
“E o mundo não tese mais”.

Absurdo?

Cultura é isso aí, oxente!

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