sábado, 26 de dezembro de 2009

A deusa que não chegou ao "céu" (crônica)

Aos três aninhos, Alice era uma linda criança. De pele rosada, cabelos loiros e cacheados, tinha os olhos azuis, quase lilás, herdados da mãe, uma gaucha nascida na fronteira com a Argentina.

A garotinha era bastante esperta, falava com desenvoltura e até lia frases curtas e esboçava alguns traços em seus desenhos infantis. De tão primorosa, chegou a ter o nome cogitado para apresentar programa televisivo para crianças da sua idade.

A emissora de televisão desistiu do contrato em virtude do exagero cobrado pelo pai para transformá-la em celebridade mirim, uma moda perniciosa ao desenvolvimento comportamental de “pequenos gênios”, como Alice.

A menina crescia em beleza e formosura. Boa aluna, estudiosa e responsável, era orientada por psicólogos e pedagogos que a instruíam para o futuro. Os exemplos das modelos desfilando nas passarelas de Nova Iorque, Milão e Paris, suas conterrâneas de sucesso vertiginoso e bem remunerado, eram imitados e perseguidos com a certeza cintilando nos olhos dos pais e produtores.

Alice chegou aos quinze anos em forma de anjo ou da divindade grega Afrodite, a deusa do amor e da beleza. Pouco se podia exigir dela para aumentar-lhe o encanto físico. Talvez Venus e La Gioconda, se a vissem, “morreriam de inveja”, dizia o seu costureiro predileto, Júpiter da Silva, considerado o deus de todos os deuses da alta costura.

Um ícone da moda tupiniquim com acesso às passarelas internacionais.

No glamour dos desfiles, o amor despontava célere em seu coraçãozinho de menina moça; mais moça que menina, principalmente se o corpo esbelto, o rosto perfeito e as pernas longas e torneadas fossem mostrados como mimo dos deuses a nós, pobres mortais.

Alice, a “maravilhosa”, recebeu o título para enaltecer sua beleza ímpar. A designação assemelhava-se às concedidas aos jogadores de futebol, por seus desempenhos em campo. “Rei, fenômeno, imperador, nada representam, comparados ao carinhoso epíteto que a impressa deu à nossa deusa”, disse, certa vez, Júpiter, seu guru e mentor de sucesso.

Certo dia, após uma noitada para comemorar o êxito de um desfile garboso em uma das pistas mais famosas do mundo da moda, Alice bebeu demasiadamente. Caiu nos braços de Baco como se aquela festa maravilhosa fosse a última.

Chegou a sua residência dirigindo o próprio carro, último modelo de expressiva marca internacional.

A mãe a recebeu à porta. Constrangida, retirou-lhe dos ombros o rico casaco, confeccionado com a pele de uma espécie criada em cativeiro, guardou seus pertences pessoais e a chave do carro, que mais tarde seria depositado na garagem lotada de outros modelos, não menos estilosos, confortáveis e invejados por grande parte dos mortais.

Algum tempo depois, Alice insistia com a mãe pela chave de algum veículo, pois pretendia retornar à festa. A mãe não permitia que saísse a dirigir em estado etílico tão preocupante e perigoso. Previdente, quando a filha adentrou o quarto, localizado no segundo andar do apartamento, fechou a porta para salvaguardar-lhe o estado físico, a saúde ou a vida dela e de pessoas que eventualmente cruzassem o caminho da bela modelo.

A jovem, percebendo a manobra materna, retirou de um pequeno bauzinho dourado uma das chaves reservas dos veículos estacionados na garagem. Tentou o trinco da porta: fechada! Abriu a janela, ultrapassou o portal, procurou apoio para os pés, e despencou janela abaixo.

Espatifou-se no chão de concreto.

A queda partiu-lhe ossos da face, do crânio, das pernas, deformando-lhe o corpo perfeito, vitimado pelo excesso de bebidas alcoólicas no embalo festivo para onde pretendia voltar.

Não deu.

Pobre Alice, que hoje vive deformada, em estado semivivo, a depender de terceiros para satisfazer-lhe as necessidades físicas.

O excesso é sempre prejudicial.

De álcool, pior ainda.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

"... E o amor de muitos esfriará" (crônica)

Os que gostam de cinema buscam na televisão fascinantes histórias de amor, ódio, vingança, suspense ou terror, para se divertir, ocupar o tempo ou desanuviar o espírito indagativo; os amantes da música recorrem aos aparelhos de som em busca de suaves e inspiradas melodias; os fascinados pela leitura procuram nos livros o conhecimento e a diversão oferecidos por estes maravilhosos instrumentos do saber; os ligados à arte de escrever empunham suas penas silenciosas a fim de produzir frases rebuscadas que lhes permitam a construção de ideias originais e instrutivas.

Há, ainda, os da era cibernética, “vidrados” em notícias, curiosidades, passa tempo ou bisbilhotice. Todos, em minha opinião, agem corretamente, pois seguem suas convicções, seus interesses, gostos e atitudes.

Nada contra.

Pelo contrário. Aplaudo os que buscam o conhecimento.

Independente da forma.

Sou um desses “loucos” pela televisão; não aquela tevê irreverente, apelativa, atrevida, contrária aos bons costumes, à ordem e à decência, mas a entidade divertida, educativa e instrutiva. Também gosto da música, da leitura e, muito mais ainda, da escrita. Meu hábito de escrever às vezes se sobrepõe a outros interesses pessoais. Escrevo por prazer, apenas preocupado em não desagradar o leitor que eventualmente me lê. Por respeitá-lo, esforço-me para não agredir o vernáculo com assídua frequência.

Os erros gramaticais causam-me horror.

Nem por isso deixo de escrever.

Que o leitor me perdoe e Deus tenha misericórdia de mim!

Não nego. Sou assíduo frequentador da caixa de mensagem do meu computador pessoal. Ligo-o diariamente para receber os e-mails enviados por seletos amigos.

Infelizmente, alguns são portadores de ofertas irritantes de produtos ou serviços de rara utilidade e de pouco interesse de minha parte; outros contêm belas mensagens de amor Cristão, conselhos amigos, pedidos de ajuda fraternal a pessoas necessitadas... A maioria é oportuna e interessante; muitos são debochados, irreverentes e até pornográficos.

O que fazer, se defendemos a liberdade de informação?

Hoje, por exemplo, recebi uma dessas mensagens que me tocou muito a sensibilidade. Depois de tê-la compartilhado com os amigos que me distinguiram com o fornecimento de seus endereços eletrônicos, desejo também comparti-lo com os leitores de O Recanto das Letras, por serem merecedores de minha mais elevada consideração. A deferência que sinto por esses amigos cibernéticos fez-me tomar a iniciativa de transcrever a seguinte mensagem, resumida, porém sem alterar-lhe essência, para que dela tomem conhecimento.

Ei-la, portanto:

Os personagens dessa história são Agenor e Ricardinho. Pai e filho. Ambos perambulam pela cidade grande; Agenor, em busca do emprego negado há dois anos. Pai e filho amargam momentos difíceis, com a fome de dias a importunar-lhes os estômagos vazios que reclamam de dores agudas provocadas pelo ácido clorídrico. O garoto diz, repetidas vezes, estar faminto; Agenor pede-lhe paciência. Entra em uma padaria e conta ao proprietário o que tanto lhe atormenta: a falta de emprego que lhe proporcione meios para o sustento da família. Oferece-se ao senhor Amaro para lavar o chão, pratos e copos, qualquer serviço que seja em troca de comida para ele e o filho.

O senhor Amaro, condoído com a história dos dois, fornece-lhes duas suculentas refeições. Ricardinho principia a devorar a comida sem delongas; Agenor sente as lágrimas escorrerem pelo rosto, misturando-se aos ingredientes que se tornam um bolo difícil de engolir. Amaro percebe a dificuldade do homem e pergunta-lhe o que ainda está acontecendo. “Não posso comer, sabendo estar minha esposa e dois outros filhos em casa, com fome de dias”.

Amaro tranquiliza-o dizendo que lhe arrumará emprego. Providenciou não só o trabalho, como lhe forneceu uma cesta básica de alimentos para os próximos quinze dias.

A família agradeceria ao seu benfeitor por toda vida!

Agenor foi grato ao senhor Amaro, trabalhando com afinco e desmedido interesse. O patrão convenceu-o a estudar em uma escola próxima.

Doze anos depois, Agenor adentrou a padaria vestido em seu elegante terno de advogado. Montara escritório para servir, principalmente, aos pobres, desvalidos da justiça dos homens. Amaro sentiu-se feliz ao ver o amigo tornar-se um vencedor. Agora, doutor Agenor Batista de Medeiros ajudaria aos que, como ele, não tinham como saciar a fome. Fundou uma instituição, à qual denominou de “Casa do Caminho”, para fornecer almoço diário aos seus duzentos frequentadores. Gratuitamente! Ricardinho administrava o empreendimento social como nutricionista, formado graças aos esforços herdados do pai.

Agenor e Amaro morreram aos 82 anos de idade; quase na mesma hora!

Ricardinho mandou afixar uma placa na entrada da Casa do Caminho. As letras impressas expressavam o elevado sentimento de solidariedade que caracterizou a vida do senhor Amaro.

A inscrição dizia:

UM DIA TIVE FOME E ME ALIMENTASTE;
ESTAVA SEM ESPERANÇAS E ME MOSTRASTE O CAMINHO;
ACORDEI SOZINHO, E ME MOSTRASTE DEUS;
ISSO NÃO TEM PREÇO!
QUE TE SOBRE O PÃO DA MISERICÓRDIA, PARA DÁ-LO A QUEM
PRECISA.

Essa história é verdadeira. Que neste Natal, você, leitor amigo, sinta no peito o desejo de ajudar ao necessitado. Atente para o que disse o aniversariante, há mais de dois mil anos: “E por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos esfriará”.

Não deixe isto acontecer.

Não com você!

Quem pariu Mateus... (crônica)

Caro leitor, se em algum momento de sua vida curiosa desejar acessar o site resistênciademocráticabr.blogspot.com, não se assuste com as notícias ali veiculadas. Por certo tomará conhecimento de casos escabrosos, já conhecidos, e de outros que apenas confirmarão a sua desconfiança quanto ao procedimento antiético de alguns políticos.

E olhe que são muitos!

Talvez você canse os olhos e emporcalhe a mente com as estórias narradas, uma delas sob os auspícios de Adriana Vandoni, economista, especializada em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas/EBAPE-RJ, professora universitária e comentarista política. Ela também é editora-chefe do site “prosa&política”.

Leia parte da reprodução do que escreveu a insigne professora:

“Quanto mais passa o tempo, cada vez mais me convenço de que Luiz Inácio é um s... (optei pela reticência por respeito ao cargo exercido por Sua Excelência), ou pelo menos age como se fosse. Há tempos, citei em um artigo a infame teoria que rege a vida de Lula, segundo suas próprias palavras, de que achado não é roubado. Em maio deste ano li uma matéria em IstoÉ, com Denise Paraná, uma escritora de que nada sei a seu respeito além de que é amiga de Lula e o admira, o que para mim já basta para ter as piores impressões e aceitar que ela vê luzes quando Lula fala. A matéria é sobre a vida de Lula e como ele, segundo ela, driblou o destino”.

Bem, caro leitor, para não ser mero escriba que apenas reproduz o que escreveu a doutora Adriana, tentarei sintetizar as informações e a opinião dela sobre o drible e o destino do atual presidente da República:

Lula teria como triste lembrança, o fato de não ter comido carne, ele e a família, em tempos passados. “A carne que a gente comia era mortadela que meu irmão roubava da padaria em que trabalhava”.

Conforme consta do livro de Denise Paraná, reproduzindo dizeres de Lula em entrevista concedida a autora, consoante relata Adriana, o sortudo do “primeiro irmão” achou um pacote de dinheiro, algo em torno de 34 salários mínimos, aproximadamente vinte mil reais em moeda atualizada.

A dinheirama estava embrulhada num jornal, embaixo de um carrinho (de supermercado?). Como ninguém reclamou a perda, o numerário serviu para quitar o aluguel de cinco meses atrasados e para as despesas com a mudança da família para Vila Carioca, em São Bernardo do Campo, São Paulo.

Tempos depois, o presidente Lula premiou com largos elogios um funcionário do Aeroporto de Brasília que achou um pacote de dólares e fez de tudo para devolvê-lo ao legítimo dono, como de fato aconteceu.

Excelente mudança de entendimento!

Seria o início da propalada metamorfose que acometeu o presidente?

Em passado distante, a idéia de que “achado não é roubado” valeu à família presidencial a transferência que definiu sua carreira política, o seu sucesso pessoal, financeiro e patrimonial.

Esses relatos constam do livro da Denise, que serviu à produção do filme “O filho do Brasil”, recém lançado para alçar às alturas a imagem do presidente, torná-lo um mito, e fazê-lo eleger a Dilma sua sucessora.

Não tenho outro propósito ao tratar desse assunto, a não ser o de propiciar ao leitor a oportunidade de tomar conhecimento de algumas facetas da vida do “Filho do Brasil”.

Para Adriana Vandoni, Lula não driblou seu destino, como afirma a escritora Denise Paraná. Em suas palavras ásperas, se verdadeiras não sei, “ele forjou uma vida se apossando do que não é dele. Foi programado para isso. Para não ter caráter”. E disse mais: “Lula é uma massa amorfa pelo que há de pior no ser humano”.

Valha-me, Deus!

Será?

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Excluído é você (crônica)

Já disse e repito: gosto de escrever. Infelizmente, não sou um homem das letras, inteligente, de palavra fácil e idéias brilhantes. Se o fosse, não escreveria como o faço, tímido, falto de desembaraço, formulando opiniões às vezes desprovidas de bom senso, temeroso de que minha mediocridade literária resulte no deboche irônico do leitor.

Por falta de assunto, resolvi escrever baseado em um e-mail contendo crônica do jornalista Vitor Assis Brasil, intitulada “O grito”.

Vejamos o que disse o insigne jornalista, de quem aproveitei a idéia para escrever o texto abaixo:

Pai e filho transitavam em um veículo, preso em congestionamento provocado por passeata promovida pelo MST. O garoto pergunta ao pai o significado de “inclusão social”, nome estampado em faixas exibidas pelo Movimento.

- É o direito igual para todos, responde-lhe o progenitor.

- Os integrantes do MST são excluídos? - insiste o menino.

- Sim, confirma o pai.

Após rápido silêncio, o filho volta a indagar:

- Que devo ser quando crescer?

A resposta foi incisiva:

- Estude muito, muito mesmo, trabalhe dia e noite; assim, será alguém na vida.

O pai reconhecia a exceção.

Armarga exceção!

A viagem prossegue e o pai é multado por bloquear o trânsito. O MST, escoltado por policiais e acompanhado por uma ambulância para prestar socorro médico aos integrantes da marcha, obstrui a passagem de carros e pedestres, sem ser incomodado pelas autoridades.

A Marcha Vermelha superlota as artérias urbanas, com seus integrantes portando rádios de pilhas, dos quais ouvem músicas sertanejas que embalam alegres noitadas alcoólicas. Todos empunham ferramentas de trabalho jamais usadas, capazes de serem transformadas em perigosas armas de combate.

O movimento é político.

E guerrilheiro.

Em dado momento, os Sem-Terra param para fazer suas refeições, tomar um cafezinho, uma dose de cachaça, pitar um cigarro de palha e servir-se dos “banheiros químicos” instalados nos canteiros de flores das praças. Tudo patrocinado pelo poder público, com dinheiro dos impostos pagos pelos “incluídos socialmente”.

O filho a tudo assiste perplexo. Ouve do pai respostas indignadas. O “velho” não esconde seu desapontamento com políticos corruptos e populistas. A criança deseja saber se os integrantes do MST trabalham, pagam impostos e planos de saúde. A voz do pai, ao responder, soa como um grito de revolta:

- Não, eles não trabalham!

O jovenzinho admira-se das mordomias desfrutadas pelo movimento: repasse de verbas sociais, apoio logístico, refeições gratuitas, proteção policial, e muitos outros benefícios concedidos pelo governo.

E pela Justiça, que não pune seus atos criminosos.

Enquanto o trânsito permanece interrompido, o pai lamenta a multa aplicada por obstruir o trânsito e maldiz a hora, por chegarem atrasados ao trabalho e à escola.

As vias públicas estavam bloqueadas, com apoio da polícia. Nenhuma punição seria imputada aos manifestantes. Não são castigados nem mesmo quando, selvagemente, praticam desordens e dilapidam o patrimônio público ou particular.

Pai e filho reconhecem serem eles, como muitos de nós, os verdadeiros excluídos socialmente. Também acreditam que a farra andarilha não se extinguirá enquanto os “vermelhos” estiverem no poder.

Por quanto tempo?

O MST não tem pressa.

Contrariedade diária (crônica)

Sempre discuto com amigos sobre assuntos relacionados à política brasileira. Sou crítico contumaz e ferrenho defensor da moralidade administrativa no serviço público. Não concordo com os gastos excessivos do governo, estendendo o meu descontentamento aos poderes Legislativo e Judiciário.

Leio bastante. Jornais e revistas semanais são as fontes de informações que adiciono ao noticiário do rádio e da televisão. Dessa forma, fico a par dos acontecimentos, das estatísticas e dos vexames causados pelos políticos à Nação. Entre o orgulho de ser brasileiro e a vergonha de fazer parte de um país reconhecidamente corrupto, estou mais para a segunda opção.

Nos últimos dias, aborreci-me com as mais recentes notícias da ladroagem escancarada que toma conta do Brasil. Não as citarei para não cansar o leitor, possivelmente tão bem informado quanto eu, a esse respeito.

Aborreceu-me mais saber que o terrorista Carlos Lamarca, traidor de seus companheiros de farda, foi promovido post mortem ao posto de coronel do Exército, com soldo de general-de-brigada, a ser recebido por seus herdeiros, que abocanharam mais trezentos mil reais a título indenizatório.

Terroristas e falsos patriotas estão fazendo farra com o dinheiro público.

Desgostou-me, ainda, outro motivo, para mim igualmente injustificável. Recentemente, em visita ao Palácio do Planalto, numa ensolarada manhã de domingo, constatei duas situações no mínimo descabidas, inclusive para outros que, como eu, não admitem misturar prerrogativas públicas com as de natureza privada.

Em um dos mezaninos do palácio, uma exposição de fotografias mostrava ao público visitante a trajetória vitoriosa do presidente Lula. Ele, irmãos e outros parentes (não reconheci o Vavá nas fotografias) posavam para o futuro. Mais adiante, próximo ao gabinete presidencial, um gigantesco painel recordava a posse do metalúrgico que, embora pouco tenha trabalhado, venceu.

Mesmo sem estudar.

E também sem trabalhar.

Um prêmio ao ócio.

A Comissão de Anistia não deveria ter premiado Lamarca. O terrorista, ao morrer fuzilado por verdadeiros defensores da democracia, não se encontrava sob a custódia do Estado brasileiro, mas em combate, a serviço do comunismo cubano.

O Palácio do Planalto, a exemplo do Palácio da Alvorada, que já foi decorado com a estrela do PT em seus jardins, não deveria ser local de propaganda política.

Nem de promoção pessoal.

Essas são as minhas recentes contrariedades.

Até quando?

A profecia (crônica)

Quando esta crônica for publicada, estarei distante da terra querida, onde nasci há sessenta e seis anos. Ainda hoje estou por conhecê-la como gostaria, livre dos maus políticos e da maldita corrupção que a persegue cada dia mais avassaladora.

No próximo mês, estarei em visita à Europa. De Paris, Londres, Roma, Amsterdã ou de qualquer outro lugar, serei informado pelo noticiário internacional e por amigos deixados no Brasil, sobre as frequentes operações policiais, sem resultado prático.

A Internet será outro meio de informação a que terei acesso. Há algum tempo, li que o The Los Angeles Times, renomado jornal americano, e o Clarin, conceituado matutino argentino, noticiaram sobre a “nossa corrupção”. Sim, a “nossa corrupção” (não há igual), assim mesmo, entre aspas, para destacá-la, como destacada o é nos quatro cantos do mundo.

Falar de corrupção cansa.

Satura.

Enraivece a gente.

Estamos enjoados de tantas e desairosas notícias.

Basta!

Vejamos um outro assunto, um acontecimento não tão recente, mas que pode ser transportado para os dias de hoje. Recebi de um amigo, por e-mail, o que teria dito o General Mourão Filho, nos anos setenta. O pronunciamento do destemido militar, segundo minha fonte, foi publicado em livro da editora Olympio, de Porto Alegre, em 1978.

Eis a mensagem que transcrevo na íntegra:

“Ponha-se na Presidência qualquer medíocre, louco ou semi-analfabeto, e vinte e quatro horas depois a horda de aduladores estará à sua volta, brandindo o elogio como arma, convencendo-o de que é um gênio político e um grande homem, e de que tudo o que faz está certo. Em pouco tempo, transforma-se um ignorante em um sábio, um louco em um gênio equilibrado, um primário em um estadista. E um homem nessa posição, empunhando as rédeas de um poder praticamente sem limites, embriagado pela bajulação, transforma-se num monstro perigoso”.

Seria uma profecia?

Que Deus nos valha!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Auditoria Fiscal-Tributária (Capítulo II)

Escrituração dos livros obrigatórios

Excetuando-se as microempresas e as empresas de pequeno porte, conforme será tratado no item Dispensa da Escrituração, as pessoas jurídicas sujeitas à tributação com base no lucro real (conceito fiscal de lucro tributável) obrigam-se a manter escrituração contábil com observância das leis comerciais e fiscais.

Todos os comerciantes devem seguir uma ordem uniforme de escrituração, mecanizada ou não, utilizando os livros e papéis adequados, cujo número e espécie ficam a seu critério.

A escrituração será completa, em idioma e moeda corrente nacionais, em forma mercantil, em ordem cronológica de dia, mês e ano, sem intervalos em branco, nem entrelinhas, borraduras, rasuras, emendas e transportes para as margens.

Poderão ser utilizados códigos de número ou de abreviaturas, desde que constem de livro próprio, revestido das formalidades legais. Isto significa que poderão ser utilizados códigos para títulos contábeis ou para históricos. Aconselha-se encadernar o Plano de Contas e uma Listagem dos Históricos utilizados, juntamente com o Diário que será autenticado. Assim, estaria legalizado o uso dos códigos.

É permitida a escrituração resumida do Diário, por totais que não excedam o período de um mês, relativamente a contas cujas operações sejam numerosas ou realizadas fora da sede do estabelecimento, desde que utilizados livros auxiliares para registro individualizado e conservados os documentos que permitam sua perfeita verificação.

As pessoas jurídicas que possuírem filiais, sucursais ou agências poderão manter contabilidade não centralizada, no entanto obrigam-se a incorporar os resultados de cada uma delas na escrituração da matriz, ao final de cada mês.

Os registros devem ser lançados com individuação e clareza e os livros de contabilidade, o Diário, por exemplo, devem ser encadernados, numerados e autenticados na Junta Comercial.

Para que surta os devidos efeitos jurídicos e fiscais é necessária a autenticação do livro Diário até a data da apresentação da Declaração do Imposto de Renda do exercício a que se referir. Do contrário, a fiscalização poderá considerar a escrituração como não apoiada em documentação hábil.

A autenticação dos livros mercantis por qualquer autoridade pública somente será válida quando estas forem autorizadas pelas Juntas Comerciais.

As sociedades civis poderão autenticar o seu livro Diário no Registro Civil das Pessoas Jurídicas ou no Cartório de Registro de Títulos e Documentos onde foram registrados e arquivados seus atos constitutivos.

A falsificação material ou ideológica da escrituração e dos documentos que lhe serviram de suporte, com o fim de eliminar ou reduzir o montante do imposto de renda devido ou postergar seu pagamento para período posterior, sujeita o contribuinte a multa, independente da ação penal pertinente.

As empresas comerciais e industriais deverão possuir, além dos livros de contabilidade, os seguintes livros fiscais Registro de Inventário, Registro de Entradas de Mercadorias e Registro de Apuração do Lucro Real.

Os livros Registro Permanente de Estoques e Registro de Movimento de Combustíveis serão de uso obrigatório para as empresas que exerçam, respectivamente, atividades de compra, venda, incorporação e construção de imóveis e revenda de combustíveis.


Livros auxiliares (facultativos)


Livros auxiliares de escrituração facultativa são aqueles utilizados de conformidade com a conveniência, a natureza e o volume dos negócios.

São considerados auxiliares os livros Razão, Caixa e Contas-Correntes, os quais poderão ser substituídos por fichas e a sua autenticação é dispensada quando as operações a que se reportarem tiverem sido lançadas pormenorizadamente em livros devidamente registrados.

O livro Razão deverá ser mantido em boa guarda e escriturado segundo as normas contábeis recomendadas, ou seja, a escrituração deverá ser individualizada, obedecendo a ordem cronológica das operações.

São também auxiliares da escrituração os livros fiscais como Registro de Saídas de Mercadorias, Registro de Apuração de IPI e Registro de Apuração de ICMS. Estes livros, quando autenticados pela repartição competente, servirão de justificativa à escrituração resumida no Diário.

Se a escrituração dos livros obrigatórios for feita sinteticamente, por resumo de registros, em livros auxiliares, estes também deverão ser registrados pela autoridade competente.


Escrituração por processamento de dados


O Livro Diário, bem como todos os livros comerciais e fiscais, poderá ser escriturado por processamento eletrônico de dados, em folhas numeradas seqüencialmente, devendo conter termos de abertura e de encerramento.

O contribuinte, para usar esse sistema, fica obrigado a manter documentação técnica completa e atualizada do sistema, suficiente para possibilitar a sua auditoria.

O Regulamento do Imposto de Renda estabelece que “é obrigatória para as pessoas jurídicas que possuírem patrimônio líquido superior a R$ 1.800.000,00, no balanço encerrado no período imediatamente anterior, e utilizarem sistema de processamento eletrônico nos seus registros contábeis e fiscais, a manutenção, em meio magnético ou assemelhado, à disposição da Secretaria da Receita Federal, dos respectivos arquivos e sistemas durante o prazo de cinco anos” (grifei).

Aos contribuintes que mantiverem sistema escritural eletrônico e deixarem de apresentá-lo à autoridade fiscal, no prazo de intimação, ou apresentá-lo com erros ou omissões, serão aplicadas as seguintes penalidades:

a) multa de 0,5% do valor da receita bruta no período, aos que não atenderem à forma em que devem ser apresentados os registros e respectivos arquivos;

b) multa de 5% sobre o valor da operação correspondente, aos que omitirem ou prestarem incorretamente as informações solicitadas;

c) a falta de apresentação dos arquivos e sistemas, no prazo estabelecido pela Secretaria da Receita Federal ou pelo Auditor-Fiscal, enseja multa de a R$ 115,27, por dia de atraso, até o máximo de 30 dias.


Dispensa da escrituração


Enquanto não decorrido o prazo decadencial e não prescritas eventuais ações que lhe sejam pertinentes, ficam dispensadas da escrituração as microempresas e as empresas de pequeno porte, desde que mantenham os documentos e papéis relativos a sua atividade em boa ordem e guardados convenientemente.

Essas empresas deverão manter e escriturar o Livro Caixa, no qual escriturarão toda a sua movimentação financeira, inclusive bancária, e escriturarão, ainda, o Registro de Inventário, “no qual deverão constar registrados os estoques existentes no término de cada ano-calendário”.

É importante lembrar, que toda a documentação que serviu de base à escrituração dos livros Caixa e Registro de Inventário deverá ser mantida em boa ordem e guardada à disposição da fiscalização até ser decorrido o prazo decadencial.

A dispensa da escrituração para as microempresas e as empresas de pequeno porte somente se aplicará no âmbito dos impostos federais. Ou seja, essas entidades deverão manter escrituração regular, pois, segundo a legislação, a “escrituração prova a favor do contribuinte”.

Ocorrendo ações trabalhistas, previdenciárias ou qualquer outra em que a empresa necessite de “provas”, somente poderá fazê-lo se mantiver escrituração regular na forma da legislação vigente.

O artigo 18º da Lei das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte – SIMPLES, estabelece que a elas aplicam-se as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições de que trata a referida Lei, desde que apuráveis com base nos livros e documentos a que estiverem obrigadas.


Guarda ou extravio da documentação


É necessária a guarda e conservação da escrituração e dos demais papéis pertencentes à empresa, relativos aos atos ou operações que modifiquem ou possam modificar a situação patrimonial do comerciante, enquanto não prescreverem as ações que lhes possam ser imputadas.

Ocorrendo extravio, deterioração ou destruição de livros, fichas, documentos ou papéis de interesse da escrituração, o comerciante publicará aviso correspondente ao fato, em jornal de grande circulação do local de seu estabelecimento, prestando essa informação ao órgão competente do Registro do Comércio, dentro do prazo de quarenta e oito horas. A legalização de novos livros só será providenciada depois de observadas as providências retro mencionadas.


Outros aspectos da escrituração


Anualmente, o comerciante estará obrigado a levantar um balanço geral do seu ativo e passivo, o qual deverá compreender todos os bens móveis, imóveis, mercadorias, numerário, créditos, dívidas etc.

Os lançamentos efetuados pelo contabilista produzirão os mesmos efeitos como se fossem escriturados pelo comerciante.

A Lei das Sociedades por Ações estabeleceu que ao fim de cada exercício social a companhia elaborará, com base na escrituração comercial, as seguintes demonstrações contábeis:


1. Balanço Patrimonial;
2. Demonstração do Resultado do Exercício;
3. Demonstração dos Lucros ou Prejuízos Acumulados;
4. Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos.


As demonstrações retro descritas deverão ser complementadas por notas explicativas, quadros ou outras demonstrações necessárias ao esclarecimento da situação patrimonial e do resultado do exercício.

Todas as demais pessoas jurídicas, seja qual for o seu tipo societário, exceto as microempresas e as empresas de pequeno porte, conforme vimos no item Dispensa da Escrituração, obrigam-se a elaborar, ao final de cada exercício social, as seguintes demonstrações:


1. Balanço Patrimonial;
2. Demonstração do Resultado do Exercício;
3. Demonstração de Lucros e Prejuízos Acumulados.


Os demais tipos societários, como vimos, estão desobrigados a elaborar a Demonstração de Origens e Aplicações de Recursos.

Ao final de cada período de incidência do imposto de renda, seja a apuração trimestral ou anual, as demonstrações contábeis deverão ser transcritas no livro Diário. A falta de transcrição dessas demonstrações poderá determinar o arbitramento do lucro.


Regimes de caixa e de competência


A legislação fiscal estendeu a todas as pessoas jurídicas, inclusive firmas individuais ou empresas individuais equiparadas a pessoas jurídicas, exceto aquelas beneficiadas conforme item Dispensa da Escrituração, a obrigatoriedade de efetuarem a escrituração mercantil.

Na determinação do resultado do exercício serão computados as receitas e os rendimentos ganhos no período, os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, independente de sua realização em moeda ou correspondentes a essas receitas e rendimentos.

O Regime de Caixa é o do efetivo pagamento da despesa ou do recebimento da receita. A contabilização desses fatos somente ocorre quando do desembolso ou ingresso do numerário no caixa da empresa.

O regime de caixa apresenta inconvenientes não só pela falta de informações à administração, no tocante ao volume de obrigações assumidas pela empresa, mas também porque distorce os resultados em função do período de apuração.

As receitas e os rendimentos ganhos no período serão considerados na determinação do resultado do exercício, independentemente de sua realização em dinheiro.

O Regime de Competência é, portanto, o regime em que as receitas, despesas, custos e encargos devem ser contabilizados no período financeiro a que pertencerem. Os encargos de depreciação, amortização ou exaustão, as provisões de salários e respectivos encargos sociais, honorários de diretores e assessores, 13º salário, férias etc., devem ser contabilizados pelo regime de competência, isto é, no período financeiro a que disserem respeito.

Quando tratamos da escrituração, falamos de dois regimes – o de caixa e o de competência. O primeiro impõe à contabilidade a obrigação de efetuar os registros dos fatos na data exata das entradas e saídas de dinheiro. O segundo obriga que sejam registradas as mutações patrimoniais dentro do exercício em que o fato ocorrer.

A inobservância do Regime de Competência, por si só, não constituirá fundamento para lançamento do imposto de renda por parte da autoridade fiscal. Somente ocorrerá esta hipótese se for constatada a postergação do pagamento do imposto para período posterior ao devido ou se acarretar a redução indevida do lucro real (lucro tributável) em qualquer período-base.

Rir é o melhor remédio (crônica)

"Rir é o melhor remédio”. Essa expressão dá título a uma seção da famosa revista Seleções do Reader´s Digest. Leitores de reconhecida curiosidade, que lêem do folheto entregue nos sinais de trânsito ao livro mais volumoso, de variada literatura, já se deleitaram com estórias, piadas e anedotas divulgadas naquela publicação internacional.

Rir, confirmaram pesquisas científicas, é realmente um ótimo remédio, talvez o melhor e mais eficiente para atenuar os males da vida, amenizar a nostalgia das pessoas e livrá-las da depressão. É sempre bom estar alegre, ter um sorriso nos lábios ou uma expressão jocosa no rosto, caso permita a ocasião. Enfim, deve-se “rir para não chorar”, diz o adágio de todos nós conhecido.

O brasileiro, irreverente, com seu deliberado desrespeito à moralidade, demonstrando profundo desinteresse pela coisa séria, adotou o riso como forma de indiferença ou de aprovação debochada.

Em rodas de bate papo, as pessoas costumam rir de orelha a orelha ao ouvirem sobre a improbidade de governantes, políticos de um modo geral e/ou de seus representados. Rir, nesses casos, é quase uma aprovação aos malfeitos dessa gente desonesta. Há, ainda, os que riem, com incontida hipocrisia, dos “causos” contados por seus superiores. Dissimuladamente, riem de suas verdadeiras personalidades desajustadas.

A propósito de rir, do riso como expressão facial de graça e contentamento ou como impressão cômica, ri bastante (embora envergonhado, confesso), ao ler o livro publicado pela Editora Record, de autoria dos jornalistas Eduardo Scolese e Leonencio Nossa, intitulado “Viagens com o Presidente”.

Os autores narraram incríveis acontecimentos em suas andanças com o presidente Luiz Inácio (Viajando) Lula da Silva – o andarilho. Aquele que prefere as viagens de recreio ao árduo trabalho.

São histórias nem sempre graciosas. Algumas são irreverentes, desaconselhadas para a ocasião, características de quem necessita estar em evidência constante para mostrar-se superior ou próprias de pessoas rudes, boçais, sem a devida instrução escolar, que falam agredindo o vernáculo e atropelando, sem dó nem piedade, as regras gramaticais da língua portuguesa.

O citado livro está à venda nas livrarias de todo o país. Sugiro sua leitura, isentando-me de qualquer propaganda comercial.

Leia-o, caro leitor.

É bem provável que você ria.

Ria, para não chorar.

Viagem tortuosa (crônica)

O carro parou, tentando vencer novo obstáculo da pista esburacada. Buracos que não acabavam mais. Verdadeiras crateras desafiavam os motoristas nas rodovias dos estados de Goiás, Bahia, Piauí e Ceará. Eram covas enormes, nas quais, com certo exagero, poderiam ser enterrados os que as enfrentavam com tanta bravura.

Eu era um deles.

Graças a Deus, não aconteceu o pior.

Os automóveis entravam em pane, um após outro: rodas quebradas, pneus estourados, radiadores perfurados… uma série de transtornos. Depois de horas de jornada difícil e sofrida, passageiros e motoristas estavam cansados e os veículos danificados. A fila de caminhões e de carros de passeio parecia um cortejo soturno. Todos sofriam o desconforto do calor intenso e dos balanços do carro a cada buraco ultrapassado. Um número incontável. Senhoras idosas exercitavam a fé, calejando os dedos nas contas dos seus rosários.

Pediam a Deus a proteção negada pelo governo.

Em certo ponto, fomos ultrapassados por uma “perua” que transportava um defunto, indiferente ao sofrimento de seus ex-semelhantes. Obviamente, o "de cujus" ignorava a situação. Depois de horas de viagem, sob o sol escaldante do sertão, o corpo sem vida já exalava o fétido odor da decomposição da matéria, acelerada pelo calor de quase 40º Celsius.

Os viajantes pagavam elevado tributo pela negligência do homem público, responsável pela conservação da malha viária, há muito abandonada, inclusive por esse governo que prometeu restaurá-la com a participação de Batalhões de Engenharia do Exército.

Ficou na promessa.

O dinheiro da “Cide”, contribuição sobre o consumo de gasolina, estimada em bilhões de reais, foi utilizado para pagamento do serviço da dívida. O governo optou por utilizá-lo em detrimento das estradas federais, patrimônio nacional de alta significação econômica.

A operação “tapa-buracos”, lançada com estardalhaço, reforçará o “caixa dois” da próxima campanha eleitoral. O cidadão, dessa forma, pagará duas vezes pela irresponsabilidade de seus governantes – em forma de impostos e de propina.

Os prejuízos causados aos proprietários de veículos somam-se ao desperdício de grãos e à deterioração de alimentos transportados por vias tortuosas.

Um crime que merece castigo.

O eleitor poderia punir o mal político negando-lhe o voto, a melhor arma para abater pretensões inescrupulosas.

Vergonha de ser honesto (crônica)

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.

Temo que Rui Barbosa, ao escrever essa sentença, estivesse coberto de razão. Em seu tempo, já existiam autoridades inúteis, incapazes, corruptas e injustas; pessoas más, desonestas e sem caráter povoando este Brasil desordeiro e impuro.

O triunfo de pessoas sem mérito, a deterioração da honra e o crescimento da injustiça facilitam a prosperidade do mau e envergonham o homem honesto, tanto no passado quanto no presente. Nos dias atuais, a pureza e a moral parecem ser bens escassos, ignorados por expressiva parcela da população. Principalmente pelos políticos.

O mau exemplo está por toda parte.

No Congresso Nacional, deputados e senadores desrespeitam as regras parlamentares, infringem as leis, praticam atos de corrupção, votam matérias de interesses corporativos, negam apoio às reformas de base e a projetos de interesse social, exercem o nepotismo, faltam ao trabalho, debocham do povo, praticam atos indecorosos. Nas assembléias legislativas e nas câmaras municipais, os exemplos causam arrepios aos mais anarquistas dos observadores.

No executivo, nos três níveis de governo, ministros e secretários disputam o título de “O mau administrador”. Sem penalidades a cumprir, beneficiados pela impunidade, navegam nesse “mar de lama” em que se tornou a administração pública brasileira.

O Judiciário... Ah, o Judiciário! Quem poderia julgar e aplicar penas corretivas e reparadoras senão o Judiciário, entidade que tem os olhos fechados para a injustiça e a disposição firme e constante para a prática do bem?

O Judiciário, responderia o exagerado otimista.

Seria uma utopia, pensar assim?

As maiores autoridades judiciais do país são nomeadas por critérios políticos, às vezes, sem a exigência do notório saber jurídico. Muitos magistrados são portadores das mais expressivas letras jurídicas. Porém, dependendo do “QI”, candidato menos preparado poderá ser alçado aos escalões da magistratura.

Nos Tribunais de Contas, os ministros também são nomeados por critérios políticos. São raras as sentenças aplicadas ao administrador público por seus afilhados.

Se o homem já se sentia envergonhado de ser honesto, no tempo em que o fio do bigode era honrado a qualquer custo, como se sentiria hoje, sabendo que a bandidagem campeia e que altos funcionários públicos praticam vilanias que fariam corar Ali Babá? Que políticos exorbitam de suas atribuições para desviar recursos, empregar parentes e apaniguados, e que juízes roubam, associam-se ao tráfico de drogas, vendem decisões e promovem a soltura de bandidos?

Rui, se você me ouvisse de onde está lhe diria: “conterrâneo, valoroso nordestino, cabra da peste como eu, a coisa aqui está preta. Rouba-se muito neste país. Até demais. Seqüestra-se, estupra-se, espanca-se, mata-se sem piedade, sem remorso.

E o que é pior, sem punição”.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Tudo igual (crônica)

Recentemente, viajei de Brasília a Recife, cidade nordestina, capital do estado de Pernambuco. O povo do lugar orgulha-se de sua história, de sua cultura e de seus valores intelectuais.

A cidade conheceu a riqueza durante o ciclo do açúcar, abrigou coronéis de alto coturno e libertou seus escravos. Os rios e pontes acentuavam a beleza e fascinavam o visitante. Antes, famosos e exuberantes, agora revelam a marca da poluição e do descaso das autoridades, que permitiram os esgotos domésticos desembocar em seus leitos, contaminando a água que exala odor desagradável e propicia a proliferação de mosquitos e doenças.

Hoje, Recife é uma megalópole que não consegue desvencilhar-se da pecha de violenta, com milhares de desempregados, favelados e pedintes esmolando a caridade alheia nas ruas apinhadas de gente. O número crescente de meliantes impinge à população o desconforto da abordagem física, o risco de assalto, de sequestro ou mesmo de morte.

Voltando a falar da viagem:

O vôo foi tranqüilo. O avião pertence à empresa bem administrada, que executa gastos com sobriedade. Talvez ainda não esteja envolvida com a “bancada do ar”, como são chamados os congressistas que fazem "loby" para suas congêneres. Por isso, revela boa saúde financeira. A nota destoante ficou por conta do cheiro enjoativo do amendoim torrado e das barras de cereais distribuídos franciscanamente.

Alguns passageiros liam, uns dormiam, outros conversavam, e poucos, como eu, olhavam as alturas pela janela, imaginando-se mais perto do Céu, próximo ao Criador, a quem tudo pode. No meu caso, fiz-Lhe algumas petições. Confesso que a maioria foi em meu próprio benefício. Pedi-Lhe até para abençoar o joguinho que faria na Mega Sena acumulada, tão logo o avião aterrissasse.

A aeronave voava célere, como uma águia em seus momentos de contemplação. Olhei para baixo. Estávamos sobrevoando o estado da Bahia. Fechei os olhos e pensei: “aquela é a terra de Antônio Carlos Magalhães, senador da República que renunciou ao cargo por envolvimento na violação do painel que consignava os votos secretos dos parlamentares, quando da cassação de um colega. Ele não estava só; acompanhou-o na empreitada uma dessas excelências que habitam o mundo político, hoje deputado federal”, depois de ter igualmente renunciado ao mandato de senador.

Meus pensamentos voavam com a aeronave.

Tornaram-se quase uma visão.

Vi Gil, Caetano, Gal, Maria Betânia, Jorge Amado (em uma nuvem que flutuava sobre o Pelourinho), e até o Popó, exibindo-se para conquistar a mulher que tanto relutou em aceitá-lo como marido.

Deslumbrei-me com as potencialidades minerais e com as belezas naturais indescritíveis; horrorizei-me com os grotões de pobreza, as palafitas e as favelas ornamentadas por esgotos fétidos e insalubres; notei, também, que a miséria secular não tem sido enfrentada com obstinação; que o povo continua pobre, miserável, pouco assistido nas áreas de saúde e de segurança; a renda é mal distribuída; os políticos permanecem mantendo os seus “currais eleitorais”, locupletando-se, elegendo seus parentes e amigos, perpetuando-se no poder, herdando-o como fazem os filhos com os bens deixados pelos pais.

Estava absorto em minhas observações íntimas e na minha visão quase apocalíptica, quando ouvi a voz do comandante anunciando o pouso no Aeroporto Internacional dos Guararapes, em Recife. Nem me apercebi que cruzara as fronteiras dos estados de Sergipe, Alagoas e Pernambuco.

Era tudo a mesma coisa.

Onde nasce um político, morre a honestidade!

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Sexagésima rosa (crônica)

Hoje, 22 de maio, comemoras mais um ano de vida. Neste dia festivo, compartilho contigo momentos de grande regozijo.

Lamento não ser um poeta. Como gostaria de sê-lo, pelo menos hoje, para dedicar-te os mais belos versos jamais escritos.

Não sou poeta, infelizmente. Se fosse um deles, o maior de todos, nesta hora manifestaria o meu amor por ti em versos sinceros e apaixonados.

O ano passado, quando “colheste mais uma rosa no jardim de tua existência”, como disse o poeta, a quem invejo neste instante de frágil inspiração, escrevi uma modesta crônica parabenizando-te pela significativa data.

Naquela oportunidade, não mencionei o número de anos transcorridos do teu genetlíaco. Não houve e jamais haverá constrangimento em citá-los, pois a beleza teima em não abandonar o teu corpo, assim como a pureza insiste em permanecer ornamentando a tua alma cheia de ternura.

O poeta diria tudo que pretendo dizer-te e não consigo; usaria belas frases, justas e merecidas. Como não sei fazê-lo, como ele o faria, digo-te a meu modo: neste 22 de maio, continuas linda e encantadora, a esposa fiel, a mulher eficiente e prestativa, a mãe amorosa, a avó dedicada, a sogra compreensiva e inteligente.

A cada dia, estás mais jovem. Mais bonita. Agora, mais sexy. E não é para menos. Completas sessenta anos, sem as marcas do tempo em teu corpo sadio e vigoroso; para mim, tão escultural quanto no dia em que o conheci em meus braços, há quarenta e cinco anos.

O tempo não te alcançou. Não foi implacável. Pelo contrário, foi justo como prêmio a tua bondade, ao teu caráter, ao teu jeito de ser, a tua condição de mulher-esposa, de mulher-mãe, de mulher-avó. De mulher. Simplesmente mulher.

Estás feliz, tenho certeza, agora que comemoras o teu sexagésimo aniversário. Há dois anos, senti a mesma sensação quando me tornei sexy como és hoje. Não te sentirás vergada ao peso dos anos nem te considerarás ingressada na “terceira idade”, coisa de velho, ainda distante.

És uma jovem senhora que vislumbra um novo tempo, uma nova vida, que enfrentará as primaveras vindouras com a mesma beleza, com entusiasmo, com o amor renovado para oferecê-lo a teus filhos, a teus netos e a mim, teu eterno apaixonado.

O jardim de tua existência, adubado como está, lindo e florido, com numerosos botões a desabrochar ao longo do tempo, será um campo fértil para as muitas colheitas que virão.

Saberei votar, eu, brasileiro? (crônica)

Aos sessenta e oito anos, próximo de completar sessenta e nove, já votei muitas vezes. Mesmo subtraindo o tempo em que fui impedido de exercer esse direito, por força do último regime de exceção, contribui para eleger alguns presidentes, governadores, prefeitos, senadores, deputados e vereadores.

Com essa idade, depois de frequentar a escola, inclusive de nível superior, de muito ler, ouvir e discutir temas sobre diversas áreas do conhecimento humano, de conviver com pessoas de notório saber, inteligentes, perspicazes, observadoras e críticas, julguei ter sabido escolher o dirigente do meu país, o governador do meu estado, o prefeito da minha cidade, e alguns legisladores capazes de elaborar e de votar leis justas e reparadoras de males passados.

Fui enganado.

Presidentes, governadores e prefeitos em quem votei não administraram corretamente o meu país, o meu estado e o município natal ou o que escolhi para viver e trabalhar. Revelaram-se incapazes como gerentes, perdulários, obsequiosos, interesseiros, apadrinhadores, alguns irresponsáveis e corruptos.

Os senadores e deputados que receberam o meu sufrágio, pouco ou nada fizeram para honrar suas promessas de campanha. Não se aliaram aos seus pares para votarem as reformas tributária, fiscal, política, da previdência e do judiciário, optando por alguns “remendos” aqui e ali, apenas melhorando o quadro que urgentemente precisaria mudar. Esqueceram de reformar leis e códigos que se afiguram obsoletos e que emperram o progresso do Brasil.

Isto, a nível federal. No âmbito estadual e municipal, as notícias não são mais alvissareiras.

Se pouco ou nada fizeram na gerência do estado e do município, ou se legislaram mal ou insuficientemente, perdi eu, e, por extensão, nós brasileiros de boa fé.

Certamente, joguei fora a oportunidade de ter escolhido para presidente, governador e prefeito, homens bem preparados para o exercício do cargo, dignos, conscientes de seus deveres, zelosos, fiéis aos compromissos e programas da campanha eleitoral e, sobretudo, honestos.

Possivelmente, perdi o ensejo de eleger senadores e deputados intelectualmente bem preparados, cônscios de seus deveres parlamentares e comprometidos com os interesses nacionais.

Desperdicei, também, a oportunidade de eleger vereadores que trabalhassem com seriedade e respeito por meu sofrido município.

Errei, ao sufragar-lhes os nomes.

Fui enganado pela propaganda eleitoral.

Meu julgamento foi um desastre!

Novas eleições estão próximas. Poderei ser novamente enganado ou induzido ao erro, votando mal novamente. Desta feita, porém, tentarei escolher melhor, embora não me seja fácil. Os políticos são os mesmos: velhas raposas, escolados, conhecedores de nossas fraquezas e de nossa incompetência como cidadão. Muitos são acusados de irregularidades administrativas e outros processados pela justiça. Quanto aos novos, que somente agora iniciam os primeiros passos rumo às urnas, precisamos cuidar para que não venham a nós, eleitores, como cordeiros travestidos de lobos.

Saberei votar, eu, brasileiro?

Presente inestimável (crônica)

Aniversário. Dia em que, anualmente, comemora-se determinado acontecimento. Oportunidade de relembrar alegrias passadas e de festejar saudosos e felizes momentos. Data em que se transmitem efusivos parabéns a pessoas da nossa mais alta estima.

Prefiro comemorar os acontecimentos felizes e esquecer os de triste memória. Deixo para trás as lembranças amargas e insípidas, para festejar, neste 22 de maio, com todas as veras da minha alma, o genetlíaco de minha estimada consorte.

O mês de maio é pródigo em datas da mais alta significação. Nessa parcela do calendário, comemora-se o Dia das Mães, oportunidade em que os filhos, agradecidos e felizes, reverenciam tão nobre criatura. Maio é também o mês da família, instituição divina que congrega pessoas da mesma origem, solidárias e de características comuns.

Em 22 de maio de mil novecentos e... bom, que interessa o ano? Nessa data, quase três anos após o meu nascimento, Deus fez vir ao mundo uma linda criança, pequenina, porém formosa, a quem os pais, tomados de ingente alegria, deram o nome de Matilde.

Matilde é escrito com sete letras, símbolo da perfeição; às vezes é grafado com um “h” entre o “t” e o “i” ou trocando o “e” pelo “a”. Assim: Matilde, Mathilde, Mathilda. De todas as formas, doce de pronunciar. Até uma santa católica é conhecida por esse nome. A venerável santa foi vencida em beleza e formosura pela Matilde nascida em 22 de maio de… (não importa!).

Vinte anos após aquele 22 de maio de... (que interessa o ano, repito), Deus a presenteou a mim – simples mortal – como consorte.

Hoje, 22 de maio de 2002, após quarenta e quatro anos de feliz convivência (cinco de namoro e trinta e nove de casados), e depois de constituirmos adorável família, desejo apertá-la em meus braços e repetir os versos que lhe dediquei no alvorecer de nossa vida afetiva:

No âmago do peito sinto arder,
Uma paixão desnuda e forte,
Desejando um dia aparecer,
Em minha vida, tu, como consorte.

Não fora o 22 de maio de... (o ano? Não faz diferença!), essa felicidade não teria se cumprido em minha vida.

O caminho das pedras (crônica)

Aposentado que se preza, conta com volumoso arquivo de recordações para consultá-lo nas horas ociosas, que por sinal correspondem ao dia inteiro.

São intermináveis minutos passados sem ocupar a mente, vazia de idéias e cheia de lembranças, algumas dignas de orgulho, outras de arrependimento.

Sou um desses desocupados.

Parei de trabalhar depois do quinquagésimo terceiro aniversário, com mais de trinta anos de contribuição previdenciária. Aposentei-me por invalidez. Segundo a Lei, e de acordo com a perícia médica, não tinha mais vigor físico para o trabalho. Cardiopatia grave foi o diagnóstico que motivou minha inatividade precoce.

Para ocupar o tempo, ver o dia passar sem muita angústia, leio e escrevo. Leio mais, porque escrever é difícil. Há quem pense o contrário. Escrevo quando estou inspirado, o que é uma raridade. Lamento não fazê-lo menos espaçadamente, pois as idéias são escassas, as expressões vulgares e a inteligência curta.

Hoje é um desses dias.

Quero escrever e não consigo.

Nada me vem à cabeça.

Sem assunto, questiono: escrever sobre o que?

Sobre os políticos? Ah, o assunto está muito batido, tornou-se enjoativo e me deprime lembrar as denúncias de corrupção contra essa gente desonesta. A maioria é um bando e ladrões que assalta os cofres públicos, aos olhos da Justiça, cada vez mais cega. Fico irritado por não vê-los punidos, pagando por seus muitos delitos.

Futebol? Também não é minha seara.

Religião? Aprendi que não deve ser discutida, pois dificilmente se chega a um acordo.

Arte e cultura? Não tenho conhecimento suficiente.

Então, sobre o que escreverei?

Olho o monitor e vejo o cursor piscar, desafiando minha capacidade intelectual. Por alguns minutos, migro o olhar do vídeo para o teclado e novamente para a telinha.

Nada.

Continuo improdutivo.

Levanto-me, vou à cozinha, como alguma coisa. De tanto repetir esse ato, estou com excesso de peso.

Puxo pela memória envelhecida, sem nenhum resultado. Volto mais tarde ao computador. Ensaio algumas frases, digito-as sem entusiasmo, e concluo que sou mesmo uma nulidade como escritor.

Desisto.

Desligo a máquina e retorno à leitura, admirado da capacidade imaginativa do autor, que me pareceu um gênio. Diferente de mim. A trama é perfeita; a narrativa, escrita em linguagem impecável; o número de páginas…

Como o livro é volumoso!

Tudo contribui para a auto-avaliação de minha insignificância literária.

Finalmente, olho para o computador desligado. O monitor, que há poucos instantes exibia cores vivas e luminosas, agora mostra uma tela negra, como se estivesse de luto pelo meu fracasso.

Retorno à leitura, decepcionado comigo mesmo.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Aduditoria Fiscal-Tributária (Apresentação e Capítulo I)

Apresentação

A primeira edição deste modesto trabalho foi publicada em abril de 1980, sob o título de Auditoria Fiscal-Tributária, recomendada pela então Ordem dos Contadores do Brasil.

O livro foi lançado com o propósito de servir de pequeno orientador fiscal a modestos empresários e aos profissionais das áreas de contabilidade e auditoria, principalmente aqueles em início de carreira.

Aos pequenos empresários, mostrou-lhes como diligenciar para evitarem as ações punitivas do Fisco no âmbito do Imposto de Renda.

Aos profissionais de contabilidade e de auditoria, em início de carreira, pretendeu orientar-lhes para obedecerem às exigências da Lei 6.404/76, do Decreto-lei 1.598/77 e alterações posteriores.

Em época de inflação alta, tratou de muitos aspectos exigidos pelas legislações comercial e fiscal, como a correção monetária do balanço, tema de repercussão influente no resultado do exercício social das empresas.

Hoje, algum tempo depois de sua primeira publicação, pareceu-me atualíssimo a ponto de encorajar-me a revisá-lo, atualizá-lo e reeditá-lo com os mesmos propósitos.

Mantive a idéia inicial de servir aos pequenos empresários e aos profissionais iniciantes nas áreas de contabilidade e de auditoria, tratando dos principais aspectos que envolvem a Auditoria do Imposto de Renda.

Analisei aspectos dos procedimentos contábeis e fiscais a serem observados pelo profissional de contabilidade, no seu mister, e pelo empresário que precisa de bons conhecimentos na área, objetivando evitar a ação punitiva do fisco.

Certamente não esgotei assunto tão vasto e complexo. Mas, concluí por elaborar um roteiro da auditoria fiscal do imposto de renda, procurando analisar os principais aspectos contábeis e fiscais em que ela se debruça, com inúmeros itens orientando o contribuinte e despertando-o para as implicações decorrentes do seu comportamento faltoso.

Por oportuno, lembro-lhe de que os lançamentos efetuados pelo contabilista produzirão os mesmos efeitos como se fossem escriturados pelo comerciante. É o que diz a lei. É o que tento transmitir-lhe com esta orientação.

Espero merecer o mesmo acolhimento da primeira edição, quando utilizei este trabalho como livro-texto para ministrar cursos e palestras.


LAMÉRCIO MACIEL BRAGA

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Capítulo 1

Breve história da contabilidade

Os fatos administrativos praticados pelos Faraós teriam sido registrados pelos egípcios 4.000 anos atrás. Há 2.200, os romanos classificavam as receitas em Rendas e Lucros e na escrituração dividiam as despesas em registros de Salários, Perdas e Diversões.

Na época medieval, por volta do ano 800, Carlos Magno, Rei dos francos, imperador do Ocidente, autorizou o registro do inventário anual do império em livros especiais para as Receitas e Despesas.

No ano 831 da nossa era, apareceu a primeira assinatura de um Contador em um documento. Esse fato ocorreu por ocasião da transferência de uma propriedade passada por Santo Ambrósio para um nobre italiano.

O primeiro sistema jurídico de contabilidade, segundo o Professor Francisco D’Áuria, surgiu na Roma antiga com o aparecimento dos livros Rationarum ou Breviarum, o Kalendarium, o Adversaria, o Codex Accepti et Expensi, o Tabulae Rationam e o Liber Patrimonium.

A técnica contábil foi introduzida nas transações comerciais por comerciantes italianos em meados do século XIII, restringindo-se até 1494 a lançamentos do tipo partida simples.

Com o crescimento das operações comerciais, as empresas passaram a necessitar de maiores investi-mentos em dinheiro, advindo daí os grandes empréstimos e, com eles, o desenvolvimento de uma técnica de escrituração eficiente. Surgiram, pois, os métodos de escrituração.

No século XV foi criado o método das Partidas Dobradas, de autoria do matemático italiano Frei Lucca Pacciolo, que publicou a sua obra em Veneza em 1494. Segundo esse método, todo lançamento a crédito, numa conta, faz que surja outra conta, em que se registra a mesma importância a débito e vice-versa.

Em 1795 o método das partidas dobradas sofreu uma primeira tentativa de aperfeiçoamento. O francês Edmond Degrange idealizou um método de escrituração que contemplava o Diário e o Razão em um único volume. Nascia, assim, o Diário-Razão, cabendo a Degrange, também, a criação da primeira teoria das contas.

Degrange considerava apenas duas espécies de contas: Contas do Negociante e Contas dos Correspondentes. As primeiras eram as Contas Gerais, em número de cinco – Caixa, Mercadorias Gerais, Letras a Pagar, Letras a Receber e Lucros e Perdas. As segundas eram as Contas Pessoais, tantas quantas fossem as transações. Segundo essa teoria, “todas as vezes em que se debitarem as contas pessoais, as contas gerais serão creditadas”.

O sistema de Degrange prevaleceu por mais de um século. Em 1868, no entanto, Francesco Marchi expõe a Teoria Personalística das Contas, da qual Giuseppe Cerboni criou a Logismografia, partindo do princípio de que “as contas não representam valores, mas pessoas e, por isso, devem ser consideradas de modo subjetivo”.

Em 1875, Emmanuele Pisani, criador da Estatmografia, método de escrituração por meio de balanços, tentou diversificar o método das partidas dobradas, só alcançando notoriedade em 1886 quando o usou na escrituração das repartições públicas federais da Itália.


História contemporânea (Brasil)


O Primeiro Congresso Brasileiro de Contabilidade, realizado no Rio de Janeiro em 1922, definiu a Contabilidade como sendo a “ciência que estuda e pratica as funções de orientação e controle relativas aos atos e fatos da administração econômica”.

No estudo das ciências contábeis, várias foram as escolas e pensamentos. O Contismo, o Personalismo, o Controlismo, o Aziendalismo, o Patrimonialismo, o Reditialismo ou o Universalismo foram correntes que nortearam o estudo da Contabilidade. O Brasil adotou o Patrimonialismo como conceito, aprovando essa corrente de pensamento no VII Congresso Brasileiro de Contabilidade, através de uma tese do Professor Álvaro Porto Moitinho.

No Brasil, adotamos diversas práticas de escrituração contábil. Antes do computador, utilizamos por muitos anos livros encadernados que eram previamente registrados e autenticados nas Juntas Comerciais. Con-sistiam em grandes volumes, muitos deles “pesadões”, alguns medindo cerca de 80 centímetros de tamanho por 50 centímetros de largura e composto de até 500 folhas.

Caixa, Diário, Razão, Contas-Correntes – os principais – eram indispensáveis. Estes livros, normalmente revestidos de capa preta, tinham suas páginas numeradas tipográfica, prévia e seguidamente e possuíam configurações gráficas que permitiam os lançamentos contábeis e o registro de valores em colunas próprias e ordenadas de forma a facilitar a visualização e o entendimento.

Primeiramente escriturava-se o Caixa, em ordem cronológica de dia, mês e ano, sem emendas, rasuras ou entrelinhas. Depois de somados e rigorosamente conferida a soma, que era transportada para cada página seguinte, com o saldo também transferido para o mês posterior, fazia-se um “resumo” que resultava em duas partidas – Caixa a Diversos e Diversos a Caixa.

Essas partidas eram escrituradas no Livro Diário. Após esse registro e de outros efetuados no Diário, passava-se à escrituração do Livro Razão. Ali, cada lançamento transcrito no Diário era registrado em página própria, aberta com o título de cada conta utilizada nos lançamentos do Diário, tendo-se o cuidado de registrar no Razão o número da página do Diário em que constava o lançamento e, no Diário, a página do Razão em que o título da conta estava registrado. Era um trabalho ingente e sujeito a erros e imperfeições. Os erros de lançamentos somente poderiam ser corrigidos mediante estornos, não sendo permitido raspar históricos ou valores, fazer puxadas para as margens ou escrever nas entrelinhas.

O Livro Contas-Correntes servia para, em folha individualizada por cliente ou fornecedor, registrar as compras, as vendas, os recebimentos e os pagamentos de duplicatas, de sorte que ficasse evidenciado o saldo de cada devedor ou credor, em períodos mensais.

As diferenças eventualmente surgidas por ocasião do levantamento de balancetes de verificação de saldos implicavam em uma revisão total dos lançamentos, somas, transportes de valores para outra página ou para outros livros auxiliares da escrituração, como o Razão. O acerto dos saldos poderia consumir horas ou até dias de trabalho.

Passados alguns anos, surgiu uma nova modali-dade de escrituração. Tratava-se de método em que os lançamentos datilografados com cópias a papel carbono eram copiados por processo em que se utilizava uma prensa para reprodução dos lançamentos no Livro Diário. As cópias nem sempre ficavam legíveis, exigindo que se arquivasse o “slip” do lançamento copiado, como prova posterior.

Depois, surgiu o método “Front Feed”. Uma máquina de escrever, comum, acoplada a um sistema frontal, possibilitava a inserção de uma ficha que, por sua vez, ficava sobreposta a uma folha com papel carbono copiativo. Assim, eram registrados os lançamentos. Cada ficha representava uma conta do planejamento contábil. Ao final de toda a escrituração esta folha era somada nas colunas Débito e Crédito; as somas deveriam ser necessariamente iguais. Depois, as folhas eram copiadas em placa de gelatina e, por último, reproduzida em folha “em branco” do Livro Diário, já previamente autenticado pela Junta Comercial.

Se as colunas de Débito e Crédito das folhas do Diário não coincidiam em valores, restava ao Contador procurar a diferença e acertá-la. As fichas, que contemplavam uma coluna para “saldo”, deviam ser rigorosamente somadas, sem o que as diferenças eventuais provocariam horas ou até dias de trabalho para identificar o erro. E acertá-lo, evidentemente.

Quando surgiram as máquinas eletro-mecânicas, como a Audit 1513, que utilizava sistema parecido com o “Front Feed”, a escrituração tornou-se mais rápida e eficiente. A soma das folhas do Diário e os saldos das fichas eram efetuados pela própria máquina, com mínima possibilidade de erros. O sistema para copiar as folhas no Diário utilizava também a gelatina, cujas transcrições nem sempre eram legíveis. Por causa dessa falha ou dessa deficiência, a folha que serviu para copiar era arquivada para consultas futuras em caso de dúvidas.

Todos os acertos de lançamentos, até então, eram feitos mediante estornos, deixando evidências de erros muitas vezes comprometedores.

As máquinas eletrônicas, antecessoras dos computadores, facilitaram muito a escrituração contábil. Mais eficientes, eram ágeis e silenciosas.

Por fim, os computadores. Antes, os chamados “XT”, de pequena capacidade de memória e por demais lentos, se constituíram em grande avanço. Hoje, os computadores modernos agilizam os trabalhos, fazem o serviço muito eficientemente e possibilitam os acertos mediante “exclusão” do lançamento errado sem deixar vestígios.

Nossas bodas (crônica)

Matilde, quarenta e quatro anos se passaram desde aquela tarde de 31 de agosto de 1958, quando te vi pela primeira vez. Foram transcorridos 16.060 dias até hoje, data do trigésimo nono aniversário de nosso enlace matrimonial.

Deixa-me lembrar-te os dias felizes de nosso idílio: Tinhas quinze e eu dezessete anos. Éramos quase crianças quando nos conhecemos, mas poucos amantes maduros amaram tão intensamente quanto nós.

Eu sempre te quis; tu sempre me quiseste; nós sempre nos quisemos. E continuaremos a nos querer mais e mais. O amor para nós é o sentimento maior, o motivo de nossa duradoura união.

Vivemos momentos muito felizes. Se alguns contratempos houve, não deixaram marcas; soubemos relevá-los em troca da permanência afetiva, do amor sem limites, da compreensão e da igualdade que nos tornaram tão próximos, a ponto de fazermos valer o que diz a Bíblia: somos dois em uma só carne.

O avanço dos anos maltratou meu corpo, provocou desconforto físico, modificou minha aparência – naquela época simpática aos teus olhos.

Se os anos passados não foram generosos comigo, deixando-me traços de uma velhice sofrida, se me alcançaram com tanto rigor, o mesmo não te aconteceu.

Continuas jovem e cada vez mais bela.

És a mulher carinhosa e amiga. A mulher-mãe não superou a mulher-avó, sempre disponível, conselheira, amorosa e devotada.

Hoje, nosso amor aniversaria, renova-se para continuarmos unidos, amigos, amantes, país, avós. Eu, imitando-te, copiando tuas virtudes, teu sucesso na vida; tu, seguindo a tua caminhada impecável, o teu destino sem mácula, as tuas aptidões de mulher-esposa, de mulher-mãe, de mulher-avó. De mulher-santa, a quem amo com todas as veras do meu coração.

És a razão da minha vida!

Chegou o Raphael (crônica)

Chegaste, Rafael. Que bom que vieste! O momento é oportuno e de extrema alegria. Se a tua vinda demorasse mais um pouquinho, terias matado de ansiedade a todos nós. Teus pais, como de resto a tua parentela, exultam com a tua chegada. Até os amigos de tua família, que conhecerás em breve, estão alegres e felizes.

Deixa-me, como avô, fazer as apresentações: Esta que primeiro viste foi a tua mãe, Márcia. Os gritos que agrediram teus jovens tímpanos foram a saudação de boas-vindas a este mundo, do qual te falarei no futuro.

Em segundo lugar, viste a teu pai, Luiz Roberto. A alegria o dominou no instante em que te viu; saudou-te com largo sorriso, expressando o orgulho de ter gerado a ti, o seu primogênito, a sua semente.

Essa baixinha que conheceste em seguida é a tua avó – a vovó Matilde; ela cuidará de ti como cuidou de tua mãe e dos teus tios Antônio e Mércia; não te dedicará maiores cuidados; fará exatamente como fez à tua priminha Natália, que te pegará no colo, cobrindo-te de afagos. A tia Cristina, a mãe da Natália, e o tio André, que também aguarda ansioso o seu bebê, te saúdam alegremente.

O vô, ah, o vovô Lamércio! Esse terás de agüentar. É um velho ranzinza, que de tudo reclama, em tudo acha mal feito, briguento, não gosta de barulho, principalmente quando está lendo; mas, é boa gente, podes acreditar; amar-te-á tanto quanto à tua avó, a teus tios, à tua mãe, à nora, tia Cristina, e aos genros, o tio André e teu pai.

Não te chamarei de Rafa para não irritar a tua bisavó Olívia, que nos contempla do alto dos Céus. Ela nunca gostou de apelidos.

Apresento-te, por último, o Pongo, o Frodo e o Percival. Eles já fazem parte da família. Irás gostar muito deles; porém, tenhas cuidado. São muito espertos, principalmente o papagaio.

Maria, Oneide e Heleno, nossos fiéis secretários, pediram para incluí-los nesta apresentação, desejando-te boas-vindas e as mais ricas bênçãos de Deus.

Os demais parentes, principalmente teus outros avós, irás conhecê-los em breve. “São gente boa demais da conta!” (como dizem os goianos). Acredite no Vô Lamércio, que embora chato, não mente.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Natal (crônica)

A família reuniu-se na sala, em torno da árvore ricamente ornamentada com motivos natalinos. Embora artificial, a folhagem verde realçava à luz das lâmpadas que piscavam incessantemente.

O chão estava coberto de presentes. Muitas lembranças seriam entregues à esposa, filhos, netos, genros, nora, parentes e a alguns amigos convidados para a celebração da Ceia de Natal, um acontecimento que repetimos há mais de um quarto de século. Sempre festiva e farta, a nossa comemoração do Natal supera-se a cada ano.

Os participantes comiam e bebiam alegremente, ao som de belas melodias natalinas. O momento era alegre e fraternal. Conversamos amenidades, narramos episódios interessantes da vida, relembramos vitórias pessoais, acontecimentos marcantes, compartilhando-os com os amigos que vibravam com o nosso êxito como se igualmente lhes houvesse acontecido.

Éramos felizes naquela noite festiva de verão!

Algumas pessoas conversavam à beira da piscina de águas azuis, iluminadas por luzes cintilantes. Apenas as estrelas ofuscavam o brilho da festa, sob o olhar misericordioso do Menino-Deus, do Deus-Homem, do Deus-Pai, que nos contemplava cheio de amor, sem qualquer distinção.

Não esquecemos do aniversariante, como sói acontecer em festividades realizadas na véspera do Natal. Antes da ceia, às doze horas, após a troca de presentes, realizamos breve instante de meditação. Refletimos sobre a Palavra depois da leitura em João, capítulo primeiro, versículo quatorze, que diz:

“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheia de graça e de verdade”.

Oramos em seguida, certos dessa verdade – Jesus – que veio a nós como dádiva imerecida. Abraçamo-nos, desejando-nos mutuamente um Feliz Natal. Em seguida, nos fartamos da deliciosa ceia que nos aguardava.

Hoje, confesso que naquela hora de tanta fartura, de relativo excesso, esqueci do meu semelhante. Não lembrei do pobre desempregado, sem teto, sem comida e lençol para amenizar-lhe o frio; não o imaginei sem amigos ou remédio para curar-lhe a dor; não o vi sem esperanças futuras. Não pensei no indigente sofrido que vive sob os viadutos das grandes cidades, das crianças órfãs, dos anciãos que habitam os asilos carentes, dos meninos de rua... Sequer imaginei que estivessem com fome naquela hora em que eu, minha família e meus amigos nos fartávamos de finas iguarias. Não ouvi o ronco dos seus estômagos vazios nem a voz de suas súplicas.

Pouco adiantará se apenas por ocasião das comemorações natalinas eu me dispuser a ajudar aos pobres, chegar-lhes eles com alguma doação, fazer-lhes um pequeno afago, mitigando-lhes as aflições. Depois da pequena “esmola” que lhes der, inicia-se novo período de necessidades em suas vidas. Terei de estar presente com essas atitudes no dia-a-dia, ao ver ou ouvir o sofrimento de um doente, o choro de uma criança faminta ou o gemido de um velho moribundo.

Errei em não ter lembrado dos necessitados na última comemoração do Natal. Temo que me tenha acontecido o que disse o aniversariante há quase dois mil anos:

“E por se multiplicar a iniqüidade, o amor de muitos esfriará”

De agora em diante, farei o possível para não esquecer que o Natal deve ser lembrado de janeiro a dezembro.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Envelhecer, o grande desafio (crônica)

Aos treze anos, o jovenzinho está em plena transição da infância para a adolescência, encontra-se em fase de crescimento, se desenvolve sexualmente e inicia suas funções reprodutivas. Com mais alguns anos, ingressa na idade adulta, com todas as consequências da pessoa em sua trajetória para o envelhecimento.

Casei relativamente cedo; aos vinte e um anos. Constitui uma adorável família, representada pela esposa, a quem amo com todas as veras do meu coração, e por três filhos, igualmente queridos; o primeiro, do sexo masculino, recentemente completou quarenta e seis primaveras; as meninas já são detentoras de quatro décadas cada uma, afora o excedente anual dos dias que elas omitem, com é comum às mulheres. A idade do belo sexo é expressa com inexatidão matemática. Assim, mascaram o tempo real de existência vivida nesta terra de meu Deus.

Não pretendo, aqui, tratar da minha vida particular nem expor a esposa e “as crianças” a vexames públicos. Desejo falar sobre pessoas que já “dobraram o Cabo da Boa Esperança”, ingressando na chamada “terceira idade”, categoria em que se encontram os idosos depois de ultrapassados os cinquenta anos. A primeira idade dá-se aos vinte e cinco, a segunda, aos cinquenta e a terceira, depois disso aí.

Por ser velho, idoso ou por ter ingressado na terceira idade há algum tempo, sinto-me “a cavalheiro” para falar sobre esse tema. Pois, bem: Lamentavelmente, 80% dos idosos sofrem de preconceito contra a velhice no Brasil. 35% dos velhinhos declaram ter sofrido algum tipo de maus tratos, seja por ofensas pessoais, tratamento irônico, humilhação decorrente da idade avançada em dias, falta de emprego, ausência de medicamentos, apropriação indevida de seus bens, e até lesões corporais, esta última, um ato vil, de extrema covardia e desprezo humanitário.

Vinte e seis por cento das mulheres idosas jamais foram submetidas a exames ginecológicos, enquanto 42% dos homens da terceira idade nunca visitaram um urologista para avaliarem a próstata. A estatística demonstra dois aspectos a lamentar: Primeiro, a falta de assistência à saúde dessas pessoas, por parte do governo, pois é sabido que o pobre depende exclusivamente da rede hospitalar pública para cuidar dos seus males físicos; segundo, o desconhecimento sobre as doenças orgânicas que os acometem; a ignorância que os assola está refletida no analfabetismo de 49% dos idosos, dos quais, 23% declaram não saber ler e escrever o próprio nome.

Seis por cento dos velhinhos no Brasil não têm filhos. Isso poderá ser entendido como fator de ausência afetiva; sem filhos para cuidar, ficam à mercê de pessoas estranhas de quem passam a depender, nem sempre com o devido respeito.

Outrossim, os mais velhos poderão ser alvo de atos discriminatórios e de conflitos entre a geração mais nova, que se julga prejudicada por contribuir pesadamente para a aposentadoria do cidadão improdutivo, responsável por gastos cada vez maiores, decorrentes da utilização de remédios e de cuidados médicos constantes.

Noventa e dois por cento dos velhinhos têm alguma aposentadoria.

Quanto à assistência médica...

As doenças, as dificuldades motoras, a dependência física, tudo confirma que nós, homens e mulheres, chegamos à velhice. Alguns, privilegiados pela natureza ou por terem levado a saúde a sério, alimentando-se corretamente, exercitando-se com periodicidade recomendável, chegam a esse estágio da vida em melhores condições que outros.

Há, infelizmente, os que herdaram problemas de seus ancestrais, seguiram-lhes os caminhos tortuosos das doenças genéticas, e os que fizeram de seus dias uma libertinagem sem fim, transformando-os num jogo que lhes levaram à derrota; ou seja, a uma existência sofrida e dependente.

Mas a vida é bela! Mesmo com os sintomas acima mencionados, 48% dos idosos se declaram felizes e satisfeitos assim como vivem; os caminhos percorridos, as vitórias sofridas, as derrotas transformadas em aprendizagem marcante, a família constituída com amor…

Eu, particularmente, agradeço a Deus os dias que me restarão sob Seu comando, Sua proteção, Seu beneplácito.

Aqui estou Senhor, agradecido por tudo que me concedeste nesta vida: a juventude; o amor à estimada consorte, aos filhos, netos, genros e nora; e aos amigos queridos.

Agradeço-Te, também, a velhice concedida, que desfruto desafiando o tempo.

(*) os percentuais mencionados foram obtidos em pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abrano e o SESC

Brasil que te quero próspero (crônica)

Aos sessenta e oito anos, próximo de fazer sessenta e nove – não confundir com a expressão pejorativa tão em voga hoje em dia –, fui acometido de certa crise nostálgica. Minha repentina tristeza decorreu da falta de providências e de efetividade dos governantes, sobre aspecto econômico de grande significação para o Brasil: as ferrovias.

Para um país que deseja tornar-se potência econômica, esse fator de infraestrutura é importantíssimo. Deve ser buscado obstinadamente, para que a circulação da riqueza não encontre empecilho na morosidade.

O transporte de bens e de passageiros por via ferroviária reduz o trânsito de veículos automotores nas estradas, propicia economia de manutenção do asfalto aplicado desonestamente, e minimiza os acidentes com vítimas humanas. Esse, o principal motivo.

O volume de produtos transportados ultrapassa os limites de análise econômica pertinente, o que não está sendo cogitado nesta oportunidade.

O ideal seria que as ações visando à implantação do sistema ferroviário não demorassem muito, pois brasileiros como eu, no ocaso da vida, talvez não alcancem a prosperidade trazida por esse antigo meio de transporte, hoje modernizado, eficiente e ágil. Essa não é a principal via do desenvolvimento econômico, mas, certamente, uma delas, aqui simplesmente tratada por ter sido escolhida como tema desta despretensiosa crônica.

Quem sabe, depois, falarei de outro assunto, tão ou mais importante.

Prossigo sem digressões, rumo ao corolário da ideia inicial.

A partir de 1852, as estradas de ferro brasileiras foram implementadas com visão futurista e expansionista, capitaneadas por Irineu Evangelista de Sousa, empresário que viajou à Inglaterra para conhecer “in loco” a pujança da economia britânica, responsável pela Revolução Industrial.

Irineu voltou ao Brasil convencido de que o caminho a percorrer por um país como o nosso, essencialmente agrícola, à época, seria o da industrialização. Ele próprio tornou-se industrial. Posteriormente, foi contratado pela província do Rio de Janeiro, desejosa de possuir uma ferrovia unindo a praia da Estrela, na Baia da Guanabara, à Serra de Petrópolis.

A Baronesa, locomotiva fabricada pela Manchester, da Inglaterra, e assim batizada para homenagear a mulher de Irineu Evangelista, fez sua primeira viagem em 30 de abril de 1854, partindo da praia da Estrela para Fragoso, um trecho de 14,5 quilômetros. A bordo estavam o imperador D. Pedro II e o industrial Irineu Evangelista de Souza, agraciado, na oportunidade, com o título honorífico de Barão de Mauá, concedido por Sua Alteza Real.

Honra outorgada por méritos inquestionáveis.

Trago à lume a questão de nossas ferrovias, por terem sido vergonhosa e criminosamente desmanteladas e esquecidas por sucessivos governos a partir dos anos sessenta. Alguns foram responsáveis pelo desmonte irresponsável e interesseiro, enquanto outros não se dispuseram a ressuscitá-las ou a revigorá-las, salvando-lhe o patrimônio físico – trilhos, máquinas e edificações – que aos poucos foram consumidos pela ferrugem e a depredação decorrente do abandono a que foram submetidas. Poucas ferrovias escaparam desse destino mal-são, patrocinado pelas autoridades encarregadas de zelar por sua permanência econômica. E histórica.

Em 1889, o Brasil já dispunha de mais de dez mil quilômetros de ferrovias, e entre 1911 e 1916 foram construídos cinco mil quilômetros de linhas férreas. Os números evidenciam um crescimento lento, sabendo-se que hoje dispomos apenas de 29.706 quilômetros de trilhos, embora tenhamos chegado a 34.207 quilômetros. A diferença perdeu-se na ineficiência e no desinteresse do Estado. A propósito, tal falta de empenho teria sido motivada pelo apego escuso das autoridades brasileiras aos ganhos fáceis, e velozes em ajudar a indústria automobilística a pilotar seus veículos recheados de dinheiro.

Era o propinoduto operando em alta velocidade.

A rede férrea dos Estados Unidos, a mais extensa do mundo, tem 226.612 quilômetros. A Europa está revolucionando os seus trilhos com alianças entre os países da comunidade. E nós, com os nossos míseros 29.706 quilômetros de linhas mal conservadas e desassistidas quanto a adequado apoio operacional e logístico, ficamos na rabeira, próximo de países africanos.

As autoridades tupiniquins estariam propensas a aumentar a nossa malha ferroviária. O presidente da República disse, em discurso eleitoreiro, que até 2010 construiria sete mil quilômetros de linhas férreas. O ruim disso tudo, é que o presidente fala demais; chega até mesmo a contar com o ovo no c... da galinha; costuma apresentar seus projetos como realizações efetivas, ou seja, inaugura-os antes mesmo de elaborados.

O que fazer?

É o Brasil, subindo a ladeira.

Cansado.

Os trilhos de nossa economia poderiam estar mais azeitados se o trem que conduz a corrupção desmedida, pilotado por maus e desonestos maquinistas, tivesse freio.

Você acredita em mudanças?

Nem eu!

domingo, 8 de novembro de 2009

Força-tarefa (crônica)

A coisa está ficando preta. O bicho vai pegar, se não forem tomadas urgentes providências para inibir a ação de bandidos, tanto dos que praticam crimes comuns quanto dos que assaltam o Erário.

Já é tempo de as autoridades, pelo poder que lhes compete, coibir os abusos de programas recheados de erotismo apelativo, de alta sensualidade, indecorosos e pornográficos, exibidos nas redes de televisão.

Em nome da liberdade de expressão e contra a prévia censura, falsos intelectuais e conhecidos exibicionistas defendem o contrário.

É preciso dar um basta!

A cada dia, os jornais noticiam casos de violência que já fazem parte do nosso cotidiano. São sequestros, assaltos, roubos, furtos, estupros e muitas outras selvagerias.

As televisões mostram cenas de guerra, troca de tiros entre policiais e bandidos à luz do dia, como se estivéssemos em uma guerra declarada. Os noticiários também divulgam inúmeros casos de corrupção, de desvio de verbas públicas e da utilização da máquina governamental a serviço de escusos interesses políticos e eleitoreiros.

Os programas de entretenimentos televisivos extrapolam os limites da moral e dos bons costumes. Divulgam cenas deprimentes em seus realities shows, como Casa dos Artistas e Big Brother Brasil, o primeiro, do SBT e o último, da Rede Globo. Seus apresentadores usam palavras chulas, inoportunas e até fazem gestos e exibem imagens e objetos de teores eróticos e pornográficos.

As telenovelas parecem concorrer com filmes do mais baixo nível cultural e moral. Cenas de sexo nas novelas das dezenove horas são comuns e desafiam a curiosidade das crianças que, por essas razões, não são mais tão inocentes quanto deveriam e desejariam os pais.

É preciso dar um basta!

Urgentemente!

A sociedade está em decadência. Cidades inteiras, grandes metrópoles, principalmente, estão sob o domínio do crime organizado. Em alguns estados, os bandidos já chegaram ao poder elegendo-se para cargos legislativos; eles agora elaboram normas que devemos cumprir ou fazem “vista grossa” para o que deixamos de fazer, sobretudo se for de índole criminosa.

Chegamos ao ponto, aliás, muito oportunamente, de constituir Forças-Tarefas para combater o mal que cresce assustadoramente, pois as polícias locais não dão conta do recado.

Força-tarefa é um grupo de unidades operativas, de diferentes especialidades, constituída temporariamente sob comando único, para realizar uma tarefa específica, com certa independência de procedimentos e ações. Poderá ser constituída por policiais civis e militares, procuradores federais e desembargadores, juízes de diversas instâncias e até pelas forças armadas.

É preciso dar um basta!

Com urgência.

Muitas outras Forças-Tarefa deveriam ser formadas para apurar delitos de toda ordem: dos crimes comuns contra as pessoas aos desvios de verbas públicas. Também serviriam para melhorar os sistemas de saúde e educacional do país, o funcionamento das repartições federais, estaduais e municipais e, quem sabe, dar um basta à licenciosidade de nossas emissoras de televisão.








Lamércio Maciel Braga

Economizar é preciso (crônica)

O desperdício é sempre condenável. A gastança desenfreada, também. Desde que não acarretem prejuízos a pessoas ou a projetos em execução, os gastos poderiam ser adiados para oportunidades vindouras e de recursos mais abundantes.

Economizar é próprio de pessoas inteligentes, esclarecidas, conscientes, responsáveis, preocupadas com o futuro e desejosas em progredir. É também característica de quem se preocupa com o bem estar de outros indivíduos e com a estabilidade material de negócios, de empresas ou de entidades públicas.

Economizar é preciso. Deve ser ensinado às crianças pelos pais, no lar, e pelos professores, na escola, enquanto estão na fase de desenvolvimento. O exemplo de pais e professores estimula o aprendizado. Economizar é cultura e, portanto, deve ser passada de pai para filho. A atitude de economizar deve ser praticada diariamente, com o propósito de se gastar apenas o que deve ser gasto e não o que se pode gastar.

Em qualquer sociedade, economizar é prática salutar. O povo japonês é tido como poupador contumaz. O americano do Norte aplica suas sobras financeiras no mercado de capitais. Outros povos também poupam. Até certos brasileiros, quando lhes é possível, entesouram parte do pouco que recebem.

Se a população separasse uma parcela do que gasta com a cachaça, a cervejinha consumida nos finais de tarde, as inúmeras loterias federais e estaduais, o jogo do bicho e com as máquinas “caça-níqueis”, espalhadas pelos recantos mais remotos, a poupança nacional seria bem mais representativa.

A redução de gastos desnecessários ou excessivos aumentaria a poupança nacional e financiaria investimentos do governo em projetos de combate à miséria, construção de casas populares, criação de pequenos empreendimentos; e elevaria, por conseqüência, os níveis de renda e de emprego da população.

Economizar é preciso, também em relação aos desembolsos efetuados em todos os níveis da administração pública – federal, estadual e municipal – com a propaganda de realizações exageradamente divulgadas e até falsamente comunicadas ao público.

A propaganda institucional deveria ser permitida apenas para o governo orientar o cidadão quanto ao exercício da cidadania; informá-lo na busca de emprego e de treinamentos profissionalizantes; ensiná-lo os princípios de higiene, asseio e convivência social; proporcionar-lhe os meios para que tenha acesso à escola e à saúde; e alertá-lo sobre doenças, seus males e tratamentos disponíveis.

A redução dos altos custos dessa desregrada propaganda seria revertida em benefício da comunidade; a população teria mais escolas, hospitais, segurança pública eficiente, e o aposentado uma remuneração mais justa. O Estado reduziria seu enorme déficit social. E o contribuinte não veria o produto de seus impostos escoar pelas mãos dos larápios que fazem a propaganda oficial cara, destinada a enaltecer o nome de pessoas incapazes e corruptas.

A prata da casa (crônica)

Não será por saudosismo, muito menos por esperança frustrada ou por revanchismo, que venho ao meu reduzido número de leitores, nesta oportunidade, discorrer sobre este assunto.

Situando-me a partir da segunda metade dos anos sessenta, na região Nordeste, lembro-me de estradas de terra esburacadas, lamacentas, de tráfego difícil e penoso. Lamacentas, sim, nas poucas vezes em que as chuvas mostraram-se generosas.

Por centenas de quilômetros, a viagem revelava-se cansativa. Os negócios que se pretendiam realizar em outras praças resultavam pouco lucrativos. O tempo de percurso entre uma cidade e outra onerava os custos do transporte. O excesso de consumo de combustível, as despesas com refeições e pousada e os gastos com peças de reposição dos veículos inviabilizavam os pequenos empreendimentos.

A economia da região, afetada negativamente por diversos fatores, principalmente pela carência de chuvas, que impediam a terra de produzir convenientemente, não conhecia o setor do “turismo”, hoje uma das principais, senão a principal alavanca do seu desenvolvimento.

A falta de boas estradas pouco estimulava os viajantes. Os raros turistas, à época, foram privados de conhecer as belezas naturais da região, suas praias aconchegantes, a culinária (mesmo a mais exótica) e seu povo espontâneo e hospitaleiro.

Lembro-me da rodovia ligando o alto sertão paraibano ao litoral do estado, asfaltada por um grupamento de engenharia do Exército. Foram 360 quilômetros de excelente trabalho.

A obra exemplar, extensa e durável, levou o sertão à capital e propiciou o progresso, a melhoria de vida do sertanejo, a comodidade do viajante e o surgimento de novas cidades; encurtou as distâncias, apressou o tráfego e integrou as comunidades rurais e citadinas.

Reconheço não ser da competência das forças armadas a construção de estradas, o asfaltamento e a sua conservação, como não seria atribuição sua edificar hospitais, escolas e presídios. Todavia, teríamos, dessa forma, a certificação de boa qualidade das obras, a baixo custo, resistentes ao tempo, sem a interferência maléfica de políticos aproveitadores, de empreiteiros apaniguados, também desonestos, corruptores e influentes no governo.

Ademais, seria a oportunidade de nossos militares aproveitarem melhor a estrutura física e operacional de suas instalações e equipamentos.

Admitindo como positiva a idéia, poderíamos concluir que a sua materialização levaria o país a somar capacidade, qualidade e disciplina; a diminuir custos, corrupção e má gestão da coisa pública; a multiplicar a infra-estrutura nacional e a sua riqueza, para, depois, dividir os benefícios com a população.

De verdade!

sábado, 31 de outubro de 2009

O taxista (conto)

O táxi corria pelo asfalto cheio de buracos e depressões, a uma velocidade de cinqüenta quilômetros por hora. Vicente, o motorista, transitava pelas imediações do aeroporto quando foi abordado por um passageiro:

– Táxi! Táxi!

O veículo parou. Um elegante senhor abriu a porta traseira direita e entrou. Sentado junto à porta, colocou a pasta tipo executivo sobre os joelhos, protegida pelas duas mãos. Olhou para os lados, talvez preocupado com alguma presença indesejável. Então, ordenou ao taxista:

– Rua das Camélias, bairro da Independência, por favor!

– Pois não, senhor! – respondeu Vicente, depois de olhar para trás e verificar se o passageiro estava bem acomodado. Voltou-se para frente e pôs o carro em movimento.

O táxi seguia o percurso indicado. Vez ou outra, o motorista olhava pelo retrovisor e via aquele cavalheiro sentado, com ares de muita apreensão. A cada instante olhava para os lados, consultava o relógio, inquietava-se. As mãos fortes seguravam cuidadosamente a pasta que transportava.

Disposto a iniciar o costumeiro diálogo com os passageiros, às vezes para por fim à monotonia ou simplesmente por curiosidade, Vicente perguntou:

– Vem de São Paulo?

– Sim.

Fez-se um pequeno silêncio, interrompido pela voz do taxista que insistia em dialogar:

– Quer usar o celular? É cortesia da “casa” – disse, ao erguer a mão direita e exibir o telefone enquanto novamente olhava pelo espelho retrovisor. - O senhor parece tenso. Algum problema?

– Não. É que estou ansioso para chegar. Tenho muitas coisas a fazer. À noite, darei uma festa para recepcionar um empresário paulista. Um amigo, com quem mantenho relações comerciais.

Algum tempo depois, o silêncio foi novamente quebrado, dessa vez pelo passageiro que anunciou:

– Finalmente, chegamos! Pode parar. É essa casa da esquina – disse, com o dedo indicador da mão direita apontado para uma belíssima mansão de dois pavimentos. Em seguida, retirou da carteira uma cédula de cinquenta reais, com a qual pagou ao taxista.

Vicente parou o táxi em frente da casa, um palacete construído com esmero, bem ajardinado e alegre. Parecia uma dessas construções caríssimas, exibidas em filmes de luxo.

– Trinta reais! – anunciou o motorista, ao zerar o taxímetro. – Como é mesmo o seu nome, doutor?

– Pereira. José Pereira. – Muito obrigado. Esqueça o troco! – respondeu ao sair.

O passageiro retirou-se rapidamente. Segurava a pasta em baixo do braço esquerdo, apoiada pela mão direita. Renovava, assim, o excesso de cuidado com o objeto que conduzia.

***

À noite, por volta de vinte e uma horas, a festa foi iniciada na casa do doutor Pereira. Havia muita gente; a maioria políticos e empresários. Carros de luxo, homens elegantes e senhoras bonitas davam o tom alegre do ambiente. Doutor Pereira e sua mulher, dona Silene, recebiam os convidados efusivamente.

O banquete começou ao som de muita música. Os cumprimentos entre os convidados, as conversas de “pé-de-orelha” e os beijinhos trocados entre os participantes confirmavam a hipocrisia peculiar aos políticos.

No grande salão, ricamente ornamentado, eram servidos os mais variados drinques: bom uísque e excelentes vinhos. Canapés deliciosamente recheados, caviar, salmão e outras finas iguarias completavam a exuberância do acontecimento.

O grande relógio fixado à parede da sala, onde se viam magníficas obras de Picasso, Van Gogh, Rembrandt e bom número de peças de arte, de autoria de renomados escultores, soou estridentemente.

Eram vinte e três horas.

O jantar seria servido em seguida.

Os convidados conversavam descontraidamente, até serem chamados pela anfitriã para tomarem assento às mesas. Nesse instante, determinado cavalheiro, de nome Enéas Ricaço, passou mal e caiu ao chão, desfalecido. O conteúdo do copo que trazia à mão sujou o rico tapete Persa que ornamentava a sala.

Grande alvoroço tomou conta do recinto.

Alguns médicos acorreram de imediato, na tentativa de assistir à vítima.

– Morto! – revelou o doutor Saudelino, que tomara o pulso do senhor Enéas e consultara-lhe a carótida. – Definitivamente morto! – disse o médico aos circunstantes.

Enéas Ricaço era conhecido empresário de São Paulo; explorava o ramo da construção civil. Viera à cidade participar de negociações com o governo local. Tratava-se de licitação para erguer uma majestosa ponte sobre o Lago Sulino, obra que aproximaria distâncias, valorizaria imóveis da região e traria, sem dúvida, grandes dividendos políticos ao prefeito da cidade.

– O que terá acontecido, meu Deus? – gritou o doutor Pereira, desconsolado.

O morto estava estendido no chão, os olhos abertos, como se estivessem a fitar o teto ricamente iluminado por lustres de cristais importados da Europa.

– Enfarte fulminante? – perguntou outro empresário, sem obter resposta.

– Chamem uma ambulância! – gritou alguém, suspendendo o defunto pelos ombros.

A ambulância chegou e o corpo do doutor Enéas foi removido para um hospital de luxo. Embora morto em circunstâncias desconhecidas, não iria para o IML. Sua mulher não permitiu que o marido fosse aberto como um frango, a exemplo do que acontecera às vítimas do massacre do Carandiru.

O deputado Louis Américo Flary, presente ao acontecimento, sentiu-se constrangido com a citação da senhora; pigarreou por duas vezes e bebeu, de um só gole, todo o conteúdo do copo que trazia à mão.

A polícia foi chamada com certa demora.

O corpo já havia sido removido e pouco restava a fazer. A festa acabou e as especulações recomeçaram.

– Acho que o Ricaço foi envenenado!

– Como assim? Por que você desconfia?

– Não sei. Essas concorrências… muito dinheiro… resultado conhecido por antecipação… – respon-deu, insinuativamente, um dos convidados.

– Quem sabe, um concorrente alijado do processo licitatório? – insistiu outro, sem encontrar apoio aos seus comentários.

– Não gostaria de falar mais sobre o assunto – finalizou certo construtor, disposto a encerrar as especulações.

Às três horas da manhã, depois das diligências policiais de praxe, em que foram interpelados poucas autoridades presentes e todos os serviçais – garçons principalmente –, não restava mais ninguém na casa, exceto os respectivos moradores.

A residência, horas antes alegre e festiva, parecia uma capela fúnebre, com o ambiente pesado, triste, quase escuro, assustador, fantasmagórico.

Os médicos atestaram, posteriormente, que Enéas Ricaço morrera de infarto.

Simples, assim.

***

A licitação para construção da terceira ponte realizou-se no dia seguinte, mesmo sem a presença do doutor Enéas, o que seria impossível. Estava morto. Foi representado por doutor Pereira, executivo maior da empresa.

Divulgado o resultado, veio a confirmação: a Organização Ricaço saíra vencedora. Iria executar a construção pelos setenta milhões de reais orçados, certa de chegar ao dobro ou até mais com os reajustes posteriores. Era o que sempre acontecia nas negociações entre governo e empreiteiras.

Vicente, o taxista, passava em frente ao palácio da prefeitura, onde se realizou a licitação, quando ouviu uma voz.

– Táxi! Táxi!

O motorista parou o veículo. Nele, entrou um senhor de cabelos grisalhos, com uma pasta executiva que fez Vicente lembrar a do dia anterior, conduzida por doutor Pereira. Ao entrar no carro, o passageiro colocou-a no banco traseiro em que se sentara. O gesto brusco fez a maleta abrir-se inesperadamente, revelando o conteúdo de milhares de reais. O passageiro apressou-se em fechá-la, sob o olhar atento do motorista pelo retrovisor.

“Aí tem!” – pensou Vicente, certo de que, brevemente, ouviria falar de mais uma licitação fraudada.

Uma prática sem fim.