quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O seqüestro (conto)

A loja do Mac Donald’s estava superlotada de jovens, a maioria adolescentes, acompanhados de suas namoradinhas. Sentados às respectivas mesas, distantes cinco metros um do outro, Marinalva e Antero ensaiavam virtual namoro.

A cada mordida no big mac, degustado saborosamente, seguia-se um olhar acompanhado de sorriso ou de aceno de cabeça, como se perguntassem e ao mesmo tempo respondessem, por sinais, às formulações feitas mutuamente.

Experimentavam as primeiras insinuações amorosas, envolvidos em clima de intensa felicidade. A delícia que sentiam era compartilhada tanto pelo paladar quanto pelo coração. O big mac e o flerte faziam bem a ambos.

Terminada a pequena refeição, Antero se dirigiu à linda garota, ainda quase menina, e perguntou se poderia sentar-se ao lado dela, à mesa. A resposta foi imediata e positiva. Minutos depois, bem animados, conversavam amenidades. Falaram de música, de cinema, revelaram as preferências de cada um. Não faltaram menções a Sandy e Júnior nem ao Senhor dos Anéis.

Marinalva falou da escola, citou alguns amigos e em nenhum momento pareceu entediada com a conversa. Antero parecia embevecido com os encantos da moça. O olhar da jovem era penetrante, originado de dois globos esverdeados sob pálpebras ornamentadas por cílios negros e vistosos; a boca, bem delineada, emoldurada por lábios carnudos e sensuais emitia um sorriso encantador; os cabelos pretos, volumosos e macios desciam até os ombros em linha reta ao queixo, onde graciosa covinha se expandia e se contraía cada vez que forçava os lábios, rindo das manifestações ou de gestos de Antero.

O jovem ficou maravilhado com o belo corpo de Marinalva. Dois lindos seios redondos e empinados pareciam prestes a romper o tecido da blusa azul-clara, vestida naquele momento; também davam a impressão de estarem próximos a saltar do decote bastante generoso. Igualmente lindos e sensuais eram os quadris, traçados por graciosas curvas que terminavam em proporções perfeitas, até chegarem aos pés, calçados por sandálias de saltos altos, acentuando-lhes a beleza.

O encontro daquele dia resultou em grande amizade, logo transformada em amor puro e verdadeiro. Precisariam apenas de alguns anos para casar. Esperariam que a idade consolidada garantisse uma união duradoura e feliz.

Os enamorados jovens cuidaram primeiro da estabilidade financeira do casal; estudaram e concluíram curso superior; ele formou-se em engenharia, enquanto ela bacharelou-se em direito, pretendendo ingressar na magistratura.

Cinco anos após o memorável encontro naquela loja do Mac Donald’s, Antero e Marinalva marcaram o casamento. Os preparativos empolgaram a todos, desde os nubentes aos demais familiares, felizes com a união que seria celebrada em tradicional igreja da cidade, um templo em estilo gótico, com mais de duzentos anos.

No dia do festejado enlace matrimonial, a noiva internou-se em badaladíssima clínica de beleza; passaria o dia à espera da hora inesquecível. Ali, seria tratada como princesa, cuidada por cabeleireiros, manicuras, pedicuras, esteticistas do mais alto padrão, inclusive por psicólogas aptas a orientá-la sobre delicados temas conjugais. Terminariam por fornecer conselhos a respeito da noite nupcial.

Uma equipe de fotógrafos e de cinegrafistas foi contratada para acompanhar a nubente até o momento de ser conduzida ao altar.

As festividades ficaram a cargo de profissionais competentes, contratados pelo pai da noiva, a altíssimo preço, justificado pela felicidade da filha. Seria uma festa sem precedentes, linda e maravilhosa; o cardápio foi preparado pelo melhor buffet da cidade, que também serviria vinhos finos e outras bebidas de igual qualidade. Marinalva era a última filha a casar e a família compartilhava a sua felicidade.

Após almoço frugal, e depois de oportuno repouso, o noivo foi ao barbeiro. Dispensou a companhia de um velho amigo, pois desejava ficar só para imaginar sua atuação logo mais a noite.

Dirigia o carro sozinho. No percurso, foi abordado em um sinal de trânsito por dois bandidos armados de pistola automática. Os assaltantes exigiram que Antero os levasse a um caixa-rápido para sacar dinheiro de sua conta-corrente.

O rapaz tentou explicar aos meliantes que aquele era o dia do seu casamento, marcado para as vinte horas. Esperou a compreensão dos sequestradores, sem resultado. Tanto mais explicava, quanto mais dinheiro sacava em diversos caixas eletrônicos, pois dispunha do bastante para a viagem de núpcias.

Os bandidos riam gostosamente.

Exigiram de Antero uma ligação em seu celular, pois pretendiam falar com a noiva que curtia o conforto da clínica e a felicidade do momento.

– Marinalva? – falou o noivo ao telefone. – Fui sequestrado quando me dirigia ao barbeiro. Os bandidos me fizeram sacar dinheiro nos caixas automáticos. Querem falar com você.

Um dos assaltantes, depois de alguns gracejos e ameaças a Antero falou ao telefone com a noiva. A cor da tez de Marinalva mudou naquele momento de estresse, embora estivesse sob a ação de refinados produtos de beleza.

Disse o bandido:

– Não se preocupe moça, não iremos matar o seu noivo. Vamos apenas cortar o “saco” dele. Castrar esse miserável!

Marinalva desmaiou ao ouvir o que dissera o facínora. Temia pela vida do futuro marido. Ficara horrorizada com a idéia de ver Antero emasculado. Não podia imaginá-lo naquele estado. O que seria dela, se tal acontecesse?

Perdeu novamente os sentidos, quando a imagem do rapaz, “despossuído”, passou-lhe pela cabeça atormentada.

Antero argumentava com os sequestradores. Pedia para não fazerem aquilo com ele, que o soltassem, pois o tempo avançava e a hora do casamento estava próxima.

Nada.

Os rapazes riam, como se tudo não passasse de simples brincadeira. Ameaçavam cumprir a promessa feita à noiva, por telefone. Um deles sacou de um canivete, abriu a lâmina afiada, cortou um fio de cabelo da cabeça do rapaz e estendeu a mão para apalpar-lhe os órgãos genitais, naquele momento protegidos pelo grosso tecido da calça jeans.

Finalmente, o bandido agiu:

– É agora!

– Nãaao! – gritou Antero, desesperadamente.

Seu grito ecoou pelas cercanias do prédio, onde se encontrava detido.

Do estacionamento de certa agência bancária, um policial patrulhava o local. Ouvira gritos desesperados; as súplicas partiam de uma voz angustiada. A vítima precisaria ser salva imediatamente.

O guarda correu em socorro do inditoso jovem, na esperança de livrá-lo do pior. Talvez evitar-lhe a morte. Não imaginava que seu gesto heróico pudesse evitar a perda de algo tão precioso a Antero e a Marinalva.

Os bandidos fugiram. Deixaram o rapaz aos cuidados do vigilante que, em seguida, acionou a polícia pelo telefone celular.

Faltavam duas horas para o casamento.

A cerimônia foi realizada com atraso. Ocorreu na presença de familiares e amigos. No salão de festas, os recém casados receberam cumprimentos e posaram para fotografias.

Abraçados, os corpos bem unidos, o casal compartilhou beijos e abraços.

Nessa ocasião, Marinalva percebeu que os sequestradores não cumpriram a promessa.

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