segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Viagem tortuosa (crônica)

O carro parou, tentando vencer novo obstáculo da pista esburacada. Buracos que não acabavam mais. Verdadeiras crateras desafiavam os motoristas nas rodovias dos estados de Goiás, Bahia, Piauí e Ceará. Eram covas enormes, nas quais, com certo exagero, poderiam ser enterrados os que as enfrentavam com tanta bravura.

Eu era um deles.

Graças a Deus, não aconteceu o pior.

Os automóveis entravam em pane, um após outro: rodas quebradas, pneus estourados, radiadores perfurados… uma série de transtornos. Depois de horas de jornada difícil e sofrida, passageiros e motoristas estavam cansados e os veículos danificados. A fila de caminhões e de carros de passeio parecia um cortejo soturno. Todos sofriam o desconforto do calor intenso e dos balanços do carro a cada buraco ultrapassado. Um número incontável. Senhoras idosas exercitavam a fé, calejando os dedos nas contas dos seus rosários.

Pediam a Deus a proteção negada pelo governo.

Em certo ponto, fomos ultrapassados por uma “perua” que transportava um defunto, indiferente ao sofrimento de seus ex-semelhantes. Obviamente, o "de cujus" ignorava a situação. Depois de horas de viagem, sob o sol escaldante do sertão, o corpo sem vida já exalava o fétido odor da decomposição da matéria, acelerada pelo calor de quase 40º Celsius.

Os viajantes pagavam elevado tributo pela negligência do homem público, responsável pela conservação da malha viária, há muito abandonada, inclusive por esse governo que prometeu restaurá-la com a participação de Batalhões de Engenharia do Exército.

Ficou na promessa.

O dinheiro da “Cide”, contribuição sobre o consumo de gasolina, estimada em bilhões de reais, foi utilizado para pagamento do serviço da dívida. O governo optou por utilizá-lo em detrimento das estradas federais, patrimônio nacional de alta significação econômica.

A operação “tapa-buracos”, lançada com estardalhaço, reforçará o “caixa dois” da próxima campanha eleitoral. O cidadão, dessa forma, pagará duas vezes pela irresponsabilidade de seus governantes – em forma de impostos e de propina.

Os prejuízos causados aos proprietários de veículos somam-se ao desperdício de grãos e à deterioração de alimentos transportados por vias tortuosas.

Um crime que merece castigo.

O eleitor poderia punir o mal político negando-lhe o voto, a melhor arma para abater pretensões inescrupulosas.

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